2 de ago. de 2006

Abraçando a Mediocridade - por Paulo Leite

Paulo Leite é jornalista e nasceu em São Paulo. Iniciou carreira na TV em 1973, passando pela Rede Globo, TV Bandeirantes e CNT/Gazeta, já nos Estados Unidos, onde vive desde 1992. Trabalhou também nas rádios Cidade, Jovem Pan, Excelsior, Bandeirantes e Metropolitana, entre outras. Atualmente produz vídeos e desenvolve websites em Washington, DC.

Confesso que não é sempre que concordo com os editoriais da Folha de São Paulo, especialmente em temas econômicos. Mas não posso deixar de aplaudir um editorial publicado pelo jornalão paulistano com o título “Vagas precárias”, acerca do desemprego e do subemprego no Brasil.

Nosso país – parece cada vez mais claro – está optando por contentar-se com pouco. Está, por assim dizer, abraçando a mediocridade.

A Folha acerta ao dizer que “o Brasil comete um erro estratégico e ameaça as gerações futuras ao desprezar o filão nobre da competição global.” Apesar dos números apregoados pelo presidente Lula da Silva, dos tais 4,3 milhões de empregos que ele gosta de citar, a verdade é que a criação de bons empregos em nosso país empacou.

Segundo o Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), do Ministério do Trabalho, citado pela Folha, a criação de vagas com carteira assinada caiu 4,4% no primeiro semestre deste ano. Houve, é verdade, criação de vagas para pessoas com baixo nível de instrução, inclusive para analfabetos.

É sempre salutar ver mais gente trabalhando, em qualquer nível, mas um país do tamanho do Brasil não pode fingir que a criação de empregos que pagam no máximo dois salários mínimos vai resolver o problema dos brasileiros, ou vai ser suficiente para acomodar o imenso número de jovens que ingressa (ou pretende ingressar) no mercado de trabalho a cada ano.

Escreve a Folha: “A recente recuperação econômica decerto tem efeitos benéficos imediatos, embora limitados, nas condições de vida dos mais pobres. O problema é que esse avanço -além de ajudar a onerar um Estado que asfixia a sociedade para financiar-se- não tem sido acompanhado de arranjos institucionais, empresariais e políticos que favoreçam a ampliação dos investimentos nos setores de maior valor agregado e sofisticação tecnológica.”

É aí que mora realmente o perigo. Enquanto outros países investem na educação e na especialização cada vez maiores (caso da Índia, por exemplo, para não falar uma vez mais dos países orientais), o Brasil – onde muita gente se orgulha de ter um presidente “que não tem diploma” – está como sempre no caminho contrário.

É o que o editorial da Folha chama de “precarização” do emprego.

No mundo globalizado deste início de século 21, os países tendem cada vez mais à especialização. Cada país concorre no mercado internacional naquilo que é forte. O Brasil corre o risco de acabar “especializado em nada”, quer dizer, vai se transformar num grande fabricante de produtos populares – de baixa qualidade e preço – difíceis de colocar no mercado global.

E, lembra a Folha, num exportador de commodities agrícolas e minerais. Nesse cenário, escreve o jornal, “a demanda por produtos sofisticados seria suprida pelas importações”.

É muito pouco para um país que se pretende moderno, que tem até pretensões de liderança continental, ou pelo menos regional. Continuar nesse caminho é condenar nossos filhos e netos ao status de cidadãos globais de segunda classe.

“Trata-se de um erro estratégico”, diz a Folha. “Um país de 187 milhões de habitantes não pode desistir da competição em mercados de excelência. Seria o mesmo que negar às gerações futuras a perspectiva de transitarem ao nível de justiça social e pujança econômica das nações desenvolvidas”.

Ainda há tempo para reverter esse quadro. Ainda há tempo para deixar de privilegiar o Estado em detrimento de todos os outros setores da sociedade, de sugar a vitalidade do setor privado através de uma carga tributária exorbitante, ainda há tempo para levar mais a sério a educação de nossos jovens e para incentivar neles o espírito empreendedor, não a passividade de passar 35 anos num emprego mal-remunerado e sem perspectivas.

Ainda há tempo. Essa janela de oportunidade, no entanto, vai se fechar logo, logo.

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