10 de set. de 2006

A INDEPENDÊNCIA DE LUTO - por Christina Fontenelle

Depois do incrível desenvolvimento das telecomunicações e da globalização, independência, principalmente em se tratando de países e de nações, está muito longe do que costumava significar quando D. Pedro I declarou a libertação do Brasil do governo colonizador de Portugal. Hoje, no máximo, o que se tem é uma interdependência vantajosa nas relações entre países mais e os menos favorecidos econômica e militarmente. No caso do Brasil, infelizmente, o que temos é subserviência a sucessivos senhores alienígenas. Aqui, independência tornou-se um dos muitos recursos de retórica utilizados em palanques eleitoreiros para fustigar os anseios das massas populares, criminosa e intencionalmente desinformadas.

O Globo sobre o que vem acontecendo com os militares norte-americanos. A reportagem afirma que o Pentágono está enfrentando, dentro de casa, um inimigo mais feroz e predatório do que aqueles que costuma combater no exterior: os agiotas. Eles comprometem o poder militar americano porque, segundo as regras da caserna norte-americana, militares cujas dívidas superem o equivalente a 30% de sua renda não podem ser enviados para missões no exterior, já que seus problemas financeiros podem distraí-los de seus deveres e torná-los vulneráveis ao suborno. Quase todos os casos de espionagem no setor militar estão, de alguma forma, ligados à ambição financeira ou à necessidade de um oficial ou soldado.

Um em cada cinco militares americanos está nas mãos desses agiotas que cobram juros abusivos de até 780% ao ano. Segundo um levantamento do Pentágono, a média dos empréstimos é de US$350 que acabam se transformando numa dívida de US$834. A rapidez do serviço, a não verificação de ficha de crédito e a ausência de perguntas atraem os interessados. Os agiotas exigem apenas um cheque pré-datado, que sabem estar garantido, já que o Código de Justiça Militar americano penaliza os militares que passem cheques sem fundos. O salário é depositado diretamente na conta bancária dos militares, a cada 15 dias, e os agiotas, sabendo disso, cobram também por quinzena. Como 75% dos tomadores de empréstimos são incapazes de pagá-los em duas semanas, acabam rolando a dívida, pedindo dinheiro a um segundo agiota para pagar o primeiro, num processo infindável e crônico de endividamento.

Já aqui no Brasil, para resolver os problemas dos baixos salários não só de militares, mas também de funcionários públicos civis e de aposentados, Lula respondeu com o maior estelionato da história deste país: o "Microcrédito" com desconto em folha. Pelo amor de Deus! Empréstimo a juros não é melhoria de vida, é suicídio! O golpe foi aprovado pelo Congresso a partir da medida provisória 130, de 17 de setembro de 2003, assinada pelo senhor presidente da República. O crédito consignado foi contratado com os bancos (3), com valores inicialmente arbitrados em uma ou duas vezes o benefício ou o salário de cada um, mas depois houve muitas alterações e hoje há bancos emprestando cinco ou seis vezes o que a pessoa recebe. As parcelas são fixas e o "beneficiado" não pode atrasar ou deixar de pagar qualquer uma delas, já que o empréstimo é descontado em folha de pagamento. A ilegalidade é flagrante, uma vez que a Constituição prevê que o salário deve atender às necessidades básicas de alimentação, transporte, habitação, vestuário e higiene - e honrar compromissos bancários não figura entre as prioridades do salário.

Especificamente para os militares, o governo também acena com o finaciamento da compra de casas populares. Por causa dos altos riscos para a sociedade que poderiam representar os atos de "traição" cometidos por militares (voluntariamente ou por coação, já que muitos deles vivem em áreas de risco, convivendo com a criminalidade), por lidarem com armamentos poderosos e com questões de segurança nacional, equipes da Caixa Econômica Federal e dos ministérios da Defesa e das Cidades reuniram-se em março de 2005 para agilizar o financiamento da casa própria, para soldados, cabos, taifeiros e sargentos. Eles, não conseguem uma carta de crédito para escapar do aluguel, devido ao baixo valor do soldo. As prestações seriam descontadas em folha, oferecendo mais garantia à CEF, já que o índice de inadimplência seria quase inexistente e os militares só poderiam comprometer até 30% da remuneração mensal com as pretações da casa própria. Hoje, estuda-se a possibilidade de expandir a porcentagem do comprometimento da renda para até 50%. Entretanto, para o deputado federal Jair Bolsonaro (PFL-RJ), reconhecido porta-voz dos militares, o melhor financiamento seria aumentar o salário que está defasado. "A medida não vai atingir quem precisa. O militar que é de Pernambuco, por exemplo, e que vem servir no Rio, vai fazer o que com o imóvel quando for transferido?", questiona Bolsonaro, lembrando que imóveis financiados pelo SFH não podem ser vendidos e nem alugados durante o contrato.

Voltando aos empréstimos consigandos, como o dinheiro emprestado é descontado diretamente do pagamento, é impossível haver inadimplência. Por isso os juros são baixos. Mas, isso está longe de representar bondade dos bancos e muito menos prejuízos para eles. Os bancos enriqueceram ainda mais, já que, junto com o empréstimo cobram taxas e mais taxas para isso e para aquilo – inclusive para cobrir o único risco que realmente teriam, que seria a morte do "beneficiado" pelo empréstimo. Dessa maneira, os bancos obrigam os "beneficiados" a contratar seguros que garantam o pagamento em caso de óbito - prática ilegal.

Mas, o pior mesmo do empréstimo consignado é que ele criou uma falsa impressão de aquecimento da economia, com um aumento efêmero do consumo. Entretanto, ao contraírem estes empréstimos na rede bancária, já no pagamento seguinte as pessoas se vêem recebendo menos ainda do que costumavam receber – o que, por já ser insuficiente, as teria levado a tomar o empréstimo – e, uma vez pego nas malhas dos agiotas institucionalizados, a pessoa dificilmente consegue se livrar deles. O que sobrevém é a queda no consumo e uma nova restrição ao crédito. Mas, para dar manchete de jornal falando do novo aquecimento no consumo, no aumento do poder aquisitivo das pessoas (ainda que sabidamente falso) e para dar votos é um ótimo plano – mesmo sabendo que, mais cedo ou mais tarde, a verdade e a crise terão que ser enfrentadas.

A corrida dos segurados e dos funcionários públicos civis e militares aos bancos apenas comprovou a quantas anda a pauperização desse setor da população que vêm acumulando perdas há muitos anos. Não há salário e crescimento de renda, há crédito - e não só sob a forma de crédito consignado, mas também sob a forma crédito direto, oferecido por grandes empresas que estabelecem convênios com financeiras. Enquanto o setor financeiro obtém lucros recordes, o brasileiro tem um aumento de consumo atrelado ao maior nível de inadimplência dos últimos cinco anos.

Nunca foi tão fácil obter crédito direto como agora, não só para a classe média, mas principalmente para as pessoas com menor poder aquisitivo. As financeiras já atuam dentro das lojas, emprestando dinheiro ao consumidor para que ele adquira o produto que desejar - por meio de cartão de financiamento, carnê ou cheque pré-datado. A maior delas, por exemplo, a Losango (HSBC) diz o inacreditável número de 14 milhões de clientes. Outro exemplo: no ano passado, o lucro líquido das Casas Bahia cresceu 34% em relação a 2004 (de 150 para 201 milhões de reais). Não é a toa que as Casa Bahia estão com Lula. As transações feitas a partir de programas de "parceria" entre instituições financeiras e as grandes redes de loja cresceram cerca de 20% em 2005. O Magazine Luiza, por exemplo, juntou-se ao Unibanco para criar uma financeira própria, a LuizaCred.

É impressionante ver quase todas as redes de supermercados ou de lojas de vestuário - como Renner e C&A – terem passado a adotar procedimentos que sempre foram característicos de lojas que vendiam bens de consumo mais caros, como móveis e eletrodomésticos. É um claro sinal do estado de penúria a que chegou a população brasileira: as famílias não têm mais dinheiro sequer para os gastos do dia-a-dia: roupas, alimentos, produtos de limpeza, etc. Até a Petrobrás já se associou à Losango para criar um cartão de financiamento destinado a postos de combustíveis. Esta é a independência que todos estavam comemorando nos desfiles e solenidades?

Pesquisa da Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomercio-SP, entidade patronal), divulgada no dia 17 de julho, aponta um comprometimento de 40% da renda das famílias da região metropolitana de São Paulo com o pagamento de dívidas. O percentual de consumidores de inadimplentes é de 40% e a proporção de consumidores endividados é de 52%. Quando as pessoas não possuem dinheiro para comprar à vista, consumidor e comerciante tornam-se reféns de bancos e financeiras. O consumidor passa a depender cada vez mais do crédito para poder adquirir o que necessita ou deseja; o comerciante, por tabela, depende do crédito para vender. O que estes números revelam é o domínio total do setor financeiro sobre a economia e sobre a vida dos brasileiros.

Quando o consumidor não pode comprar à vista, as lojas ficam sem liquidez e precisam de dinheiro. Então, elas vendem o seu crédito a receber para alguma instituição financeira, por um valor abaixo do que teriam a receber se pudessem esperar para fazê-lo. Não é por outra razão que as instituições financeiras incentivam as vendas a crédito, mesmo em casos em que os juros pareçam pouco rentáveis. Os bancos pegam todos os créditos que têm a receber - de seus clientes, dos emitentes de cheques repassados por comerciantes, de tomadores de empréstimo e vendem (com lucro, naturalmente). Estes créditos passam a servir de lastro aos chamados Fundos de Investimentos em Direitos Creditórios (FIDCs), dirigidos à parcela mais rica da população, uma vez que para investimento neles são necessários, no mínimo, cerca de 300 mil reais. Os bancos vendem aos investidores destes fundos, à vista, os títulos representativos dos créditos que têm a receber (repassando, desta forma, o risco de inadimplência a estes investidores).

Mas, para convencê-los a realizar uma aplicação tão vantajosa para os bancos, o governo isentou os rendimentos dos FIDCs do pagamento de PIS, Cofins, CSLL e IRPJ (Imposto de Renda de Pessoa Jurídica). A incidência de impostos sobre dinheiro aplicado em FIDC é 50% menor do que sobre a especulação com ações, por exemplo. Também não há retenção de Imposto de Renda na fonte, que incidirá à alíquota de 20%, sobre a remuneração auferida pelo cotista (se este for estrangeiro, a alíquota será de 15%). Este quadro tem sido fonte de lucros estratosféricos para os grandes bancos, que vêm conseguindo os maiores lucros de sua história. Juntos, os cinco bancos mais rentáveis do país faturaram nada menos que R$ 18,8 bilhões. Estes dados correspondem apenas ao lucro direto e não englobam o que é ganho através de financeiras como Losango (HSBC), Fininvest (Unibanco), Finasa e Zogbi (Bradesco) e Taií (Itaú) – com lucros que também se situam na casa dos bilhões de reais.

É óbvio que a combinação entre o empobrecimento da sociedade e as altas taxas de juros conduzem à elevação da inadimplência. É sob a alegação deste risco que o setor financeiro justifica o fato de os juros serem tão altos. Para se ter uma idéia de quanto o sistema financeiro ganha com este tipo de situação, o Monitor Abecs (Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Créditos e Serviços) do Mercado de Cartões diz que circulam hoje no Brasil 69 milhões de cartões de crédito, 174 milhões de débito e 101 milhões de cartões de loja. O uso destes cartões cresce a taxas de, respectivamente, 25%, 19% e 16%. O setor financeiro terá lucrado em todas as etapas mais do que se o cliente tivesse pago tudo sem atraso. A administradora ganha o valor cobrado pela intermediação; o banco ganha o valor dos juros cobrados pelo empréstimo, isto quando não é ele próprio acionista da administradora, o que lhe garante lucro nas duas pontas do negócio.

Naturalmente, esta situação é vista com bons olhos pelo Fundo Monetário Internacional - FMI. Entre as "recomendações" dirigidas ao Brasil pelo diretor-gerente do órgão, Rodrigo Rato, para 2006, a ampliação do crédito estava lado a lado com a autonomia do Banco Central e a supressão de direitos trabalhistas. O governo tem cumprido obedientemente as ordens do Fundo: Em julho de 2006, o volume total de crédito atingiu R$ 668,7 bilhões, atingindo 32,6% do PIB (sendo 22,1% em recursos direcionados e 10,5% em recursos livres), o maior valor desde 1995.

E, para fechar com chave de ouro, é preciso citar a reportagem do Blog Alerta Total, de 29 de agosto, segundo a qual o Senado vai investigar denúncia de tráfico de influência do filho e do compadre do presidente da República na venda da Varig – respectivamente, o filho caçula do presidente Lula, Luiz Cláudio e o advogado Roberto Teixeira. Luiz Cláudio é padrinho de Valesca, filha de Roberto Teixeira, que é também compadre de Lula e advogado do novo presidente da Varig, Marco Antônio Audi, em mais de 20 processos a que o empresário responde judicialmente. Nos últimos anos, o advogado tem se especializado em resolver pleitos de companhias aéreas junto ao governo (cuidou dos casos VASP e Transbrasil). Um documento enviado a alguns senadores, por ex-funcionários da Varig, denuncia a participação de aliados e parentes do presidente da República na negociação, usando tráfico de influência no governo federal, para viabilizar o negócio, alegando a inédita rapidez com que o BNDES está liberando ao empresárioMarco Antônio Audi um empréstimo de R$ 1 bilhão e 700 milhões para comprar50 aviões da Embraer (ele desembolsou R$ 838 mil e 800 reais para quitar dívida com INSS, para ter direito a receber a ajuda do BNDES.

O documento ao Senado indaga ainda sobre o real motivo que levou os dirigentes da Air Canadá, que está tentando negociar a compra de 10% das ações da Varig, a promoverem, recentemente, uma audiência privada com o presidente da República, no apartamento de Lula, em São Bernardo do Campo. O dossiê também considera muita coincidência que o advogado e consultor José Dirceu de Oliveira e Silva tenha viajado três vezes para o Canadá, antes do leilão da Varig, no dia 20 de julho. A Varig foi adquirida pelo fundo norte-americano Matlin Patterson, em sociedade com a Volo do Brasil (dona da VarigLog). O dossiê enviado ao Senado também manifesta estranheza pelo fato de o operador de mercado financeiro, Luiz Eduardo Gallo, ter ficado com as rotas e concessões de espaço de aeroporto em seu nome, mesmo depois da compra da Varig pela VarigLog e pelo fundo Matlin P.

Resumindo: de independente o povo brasileiro não tem nada. Temos é de enforcados, igualzinho a Joaquim José da Silva Xavier – o Tiradentes. Somos todos reféns da ciranda financeira orquestrada pelos imperadores da Nova Ordem Mundial. E é segundo as ordens dessa gente nada brasileira que atua o Foro de São Paulo, ao qual pertence, em posição hierarquicamente vantajosa, o nosso presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Não se pode esquecer da atuação magistral do assessor de política externa do governo brasileiro, Marco Aurélio Garcia – o homem que está por trás de Lula -, incumbido de organizar a agenda e as operações latino-americanas conjuntas com os outros países latino-americanos que nos levarão a formar um bloco socialista único: a URSAL. Tudo com direito a futuros e cada vez mais falsos e sinistros desfiles de 7 de setembro. Fica a sugestão: no próximo ano, organizem uma ala de anistiados.
9/09/2006
chrisfontell@gmail.com