31 de jul. de 2006

Financial Times - por Ralph J. Hofmann

É interessante ver como que um jornal como o Financial Times percebe o Brasil, à luz de tudo que nós aqui publicamos em Blogs. Vejam abaixo um artigo de Richard Lapper, do bureau de São Paulo, publicado em 26 de Julho passado. É mais sério do que um artigo sobre os excessos etílicos do presidente. Será que Richard Lapper será convidado a trabalhar noutra freguesia?

Traduzi-o por achar de extrema importância, pois quantifica uma série de coisas que já liquidaram iniciativas de pessoas sérias que apenas queriam trabalhar corretamente dentro da lei. Há muitos anos atrás, quando eu e alguns amigos, ainda estudantes, começamos nosso primeiro pequeno negócio me perguntaram: “Você já recebeu sua primeira multa?” Poderei que éramos pessoas sérias e responsáveis. A resposta foi: “Neste país é impossível não infringir alguma lei. Quando pensas que fizeste tudo certo descobres que há alguma coisa que passou desapercebido. Há um excesso de fatores que podem gerar multas.”

Outra coisa que fica clara pelas estimativas de setor informal. A economia brasileira é muito maior, ou seja, o próprio PIB é maior do que o aparente.

Se entre os leitores houver alguma pessoa com acesso aos candidatos a presidente, peço que cobre dos mesmos, em palanque, uma posição. Particularmente daqueles partidos que acham que podem seguir semeando dinheiro de impostos entre os seus amigos e asseclas, pois sempre haverá novos “patos” para contribuírem com mais impostos. A desobediência civil ocorre hoje através da sonegação. Essa passou de crime a ato patriótico, que salva a pátria e reduz o desemprego.

Segue abaixo a íntegra do artigo:

Uma burocracia desnorteante, papelada infindável e um dos sistemas de impostos mais onerosos significa que milhares de negócios brasileiros apenas literalmente apenas podem sobreviver na ilegalidade, conforme um relatório publicado na quarta-feira.

O relatório da International Finance Corporation acha grandes variações entre os 13 estados do Brasil que foram estudados mas conclui que o Brasil precisa simplificar seus procedimentos radicalmente para competir mais eficazmente com outros mercados emergentes.

“Ainda há uma grande distância entre o melhor que o Brasil tem a oferecer e fazer negócios em Bangkok e Johannesburg, e as reformas são necessárias” alega o relatório.

“Os estados deveriam combinar as melhores práticas do Brasil – como, por exemplo, o registro de propriedades informatizado do estado nortista do Maranhão, e ao mesmo tempo tentar manter o ritmo de reformas de países como o Chile, Vietname e a Slovakia.”

Um dos maiores problemas é o imposto. Em um dos casos extremos o IFC, braço do setor privado do Banco Mundial descobriu que negócios do Rio de Janeiro enfrentariam uma conta de impostos igual a mais do que o dobro dos seus lucros brutos se pagassem todas as suas obrigações fiscais.

Na média, nos 13 estados estudados a carga de impostos, chega a 147 porcento do lucro bruto.

As alterações dos códigos de impostos estaduais e municipais ocorrem com tanta freqüência que uma empresa que possua 50 funcionários precisa de três contadores em tempo integral para se manter informada comenta Caralee McLiesh uma das autoras do relatório. Os contadores precisariam gastar 26t00 horas anuais para lidar com os impostos, mais tempo do quer qualquer dos 155 países analisados anualmente pela IFC.

O relatório estima que em 2002 e 2003, 42 porcento da atividade econômica correu na economia informal no Brasil, comparado a 33 porcento no México, 16 porcento na China e 26 porcento na Índia.

Com autorização do Ralph J. Hofmann

Vai um privilégio aí? - por Percival Puggina

Imagine, leitor, que você soubesse da existência de um privilégio disponível em algum lugar e ainda não buscado por alguém. Era só ir até lá acompanhado de um "pistolão" com prestígio suficiente para concedê-lo. Você iria? Ao ponderar essa questão no íntimo de sua consciência você certamente levaria em conta noções do tipo: "se eu não for alguém vai", ou "pistolão existe para isso, mesmo", ou ainda, "não fui eu quem criou o privilégio, se ele está lá é para ser buscado".

Não se amargure, meu amigo, minha amiga, com a possível brecha que a questão proposta acima possa sinalizar na rigidez de seu caráter. O problema, em princípio, não está na decisão que você tome; ele reside na existência do privilégio e nos padrões políticos e sócio-culturais que o criaram. É evidente que todo privilégio é abusivo na medida em que dele fica excluída a maioria; partilhado por muitos ou por todos, o privilégio perde a finalidade (e a graça).

Existem vários tipos de privilégios. O estacionamento coberto, o elevador privativo, a carteirinha que permite entrar de graça onde outros pagam, por exemplo, são expressão pequena de um mal muito maior. Sua expressão mais nociva está nos privilégios buscados junto às instituições públicas, convertidos em lei, constituídos em direito adquirido, de modo a produzir efeitos permanentes.

Tais privilégios são a vareta dos trapezistas da cena política nacional. É graças a essa vareta que eles se equilibram e não caem. E é por causa dela que o bem comum falece e a sociedade brasileira tarda em desenvolver uma cultura de justiça e eqüidade. Examine a pauta de qualquer casa legislativa (municipal, estadual ou federal); exclua os projetos de origem dos respectivos poderes executivos, e você verá que a maior parte do esforço legislativo está centrado na distribuição de favores públicos.

Por quê? A razão é sempre a mesma: o nosso sistema eleitoral, a regra do jogo político, permite que a maioria dos parlamentares se eleja mediante votos obtidos junto a grupos de interesse em nome dos quais trabalham, junto aos quais depositam sua fidelidade e com cujo benefício se comprometem de modo exclusivo. Enquanto a sociedade não perceber isso e não se empenhar na mudança da regra do jogo, continuaremos aplaudindo os mesmos atletas e suas reprováveis piruetas.
fonte: MSM.org