10 de fev. de 2008

A Tradição dos Símios


O fato de que a religião pode nos ter servido para alguma função necessária no passado não exclui a possibilidade de que hoje ela seja o maior impedimento para a construção de uma civilização global.” (Sam Harris)

Fiquei sabendo que Olavo de Carvalho comentou um artigo meu (A Tradição em Julgamento) em seu último programa ao vivo. Não costumo perder meu precioso tempo rebatendo xingamentos e agressões. Prefiro focar em debates interessantes e construtivos onde posso aprender coisas novas ou mesmo rever meus pontos. Infelizmente, isso quase nunca é possível com Olavo de Carvalho, que prefere ligar uma metralhadora giratória de adjetivos chulos. No entanto, considero útil dedicar algum tempo aqui, não para rebater os ataques pessoais de Olavo, mas sim para explicar melhor meus pontos ao leitor imparcial, já que o “filósofo” ainda consegue manipular muitas mentes desavisadas.

Em primeiro lugar, Olavo faz um patético apelo ao tempo das tradições, ironizando que os judeus devem ficar preocupados porque eu, um ninguém, resolveu questionar suas tradições. Bem, por essa brilhante linha, tudo que for antigo é bom. Só porque um costume sobreviveu por longo período, não se prova que ele deve continuar sendo praticado. Era justamente esse um dos objetivos do meu artigo, tanto que dei como exemplo o hábito dos muçulmanos de não beber vinho, somente por conta de um episódio tolo supostamente ocorrido nos tempos de Maomé. Para Olavo de Carvalho, os seguidores submissos do Islã – que quer dizer exatamente “submissão” – estão certíssimos, pois contam com os séculos da tradição. Eu conto apenas com meu questionamento, o questionamento de um desconhecido qualquer. Meu questionamento me permite degustar dos maravilhosos vinhos. Os muçulmanos, com os seus séculos de tradição, perdem esta oportunidade. Olavo aplaude.

Olavo tentou me ridicularizar por conta do significado do termo “tradição” também. Para ele, eu falava de costume, não de tradição, que teria sua causa claramente compreendida, pois é renovação constante. Como se toda tradição fosse realmente entendida pelos seus adeptos! Vide o caso das católicas que casam de branco, com véu e grinalda, ignorando o detalhe “bobo” da virgindade. Mas bastava ler meu artigo todo – algo que muito provavelmente Olavo nem fez – para saber o que eu estava tentando dizer com o uso do termo. Para ajudar no esclarecimento dos ouvintes de Olavo, aqui vão os conceitos oferecidos pelo dicionário Aurélio:

1. Ato de transmitir ou entregar.
2. Transmissão oral de lendas, fatos, etc., de idade em idade, geração em geração.
3. Transmissão de valores espirituais através de gerações.
4. Conhecimento ou prática resultante de transmissão oral ou de hábitos inveterados.
5. Recordação, memória.
6. E. Ling. O conjunto dos testemunhos, conservados ou desaparecidos, em que se materializou um texto ao longo do tempo.

Como fica claro, várias dessas definições servem exatamente para o sentido que usei no meu artigo. A tradição que coloquei em julgamento foi o ato de transmitir costumes, lendas, fatos, de geração em geração. Os exemplos oferecidos no artigo não deixam margem à dúvida, levando-me a concluir que Olavo criticou o que não leu, já que não acredito que ele seja analfabeto funcional. Bom, resta sempre a opção de desonestidade intelectual, mas melhor não especular sobre isso.

Mesmo depois de se pegar nesse detalhe do sentido da palavra, Olavo não ficou satisfeito, e condenou minha conclusão até mesmo para os casos de simples costumes cegamente seguidos. No exemplo que usei, dos macacos na jaula, Olavo afirmou que os macacos estariam certos, e eu errado. Mas quando foi que disse que uma tradição – ou costume – deve ser ignorada somente por ser uma tradição? Pelo contrário, deixei bem claro no artigo que não era esse o caso, e sim que temos a capacidade de questionar as tradições, para verificar se elas ainda fazem sentido ou não. No caso dos macacos, pode ser que a ducha de água fria fosse sempre usada para quem tentasse pegar as bananas – ou não. O exemplo é amplamente usado justamente para expor o absurdo de fazer algo somente porque todos fazem. Eu não disse no artigo que os macacos sempre levariam a ducha. Eu disse que eles levaram no começo apenas. Olavo acha que os macacos eram mais inteligentes do que eu, pois seguiam um hábito cegamente, enquanto eu perderia algum tempo buscando entender os motivos que levavam os outros a bater nos novatos. Entendo que crentes necessitam de dogmas e que questionar é, para eles, um pecado. Questionar pode levar até mesmo à fogueira, se no poder estiver algum crente fanático. As reações aos meus humildes questionamentos provam o perigo desse fanatismo.

Em resumo, a mensagem do meu artigo era bem clara: não devemos fazer algo somente porque os outros fazem e aqueles antes desses faziam também. Devemos buscar compreender os motivos pelos quais fazemos as coisas. Somente os símios – ou alguns crentes fanáticos – acham maravilhoso repetir um hábito pelo simples fato de que ele foi passado de geração em geração, sem desejar entender se ainda faz sentido racional tal prática. Será que devemos manter a escravidão somente porque ela foi tradicional no passado? Será que a submissão feminina deve ser mantida por ter sido durante tanto tempo um costume comum? Será que adúlteras devem ser apedrejadas por esse hábito ter sido praticado no passado? Os casamentos forçados devem continuar por terem sido uma tradição? As mulheres muçulmanas devem ter seu clitóris cortado em prol da tradição? Índios devem sacrificar crianças aos deuses em nome dos costumes? Judeus devem passar por uma circuncisão sem anestesia somente porque era a tradição? Devemos continuar praticando touradas somente porque são uma tradição? Os indianos devem evitar carne de vaca porque, segundo sua tradição, o animal é sagrado? Os exemplos seriam infindáveis.

Quem tem interesse em disseminar tal comportamento nas pessoas, a obediência cega aos dogmas, a repetição mecânica dos costumes, a crença fanática numa tradição, somente por ser uma tradição? Normalmente, os líderes de seitas, que criam seguidores autômatos, escravos fiéis, membros cegos de um rebanho fanático.

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PS1: Olavo ainda comentou a quantidade de coisas que escrevo, como se isso fosse prova da falta de qualidade dos textos. Curioso isso, vindo de alguém que escreve tanto quanto ele e que ainda se diz um filósofo, que deveria focar apenas nos argumentos.

PS2: Em um artigo recente, Olavo escreveu que a doutrina darwiniana coloca o ser humano no “cume da evolução animal”, demonstrando profunda falta de conhecimento sobre o darwinismo. Talvez ele pudesse evitar tais declarações se, em vez de agredir tanto os outros, ele procurasse aprender mais sobre o tema que critica.

PS3: Hayek e Mises, dois grandes liberais, escreveram sobre as diferenças gritantes entre liberalismo e conservadorismo, muitas vezes verdadeiros opostos. Eis um trecho sobre tradição escrito por Mises: "Traditionalism tries to justify its tenets by citing the success they secured in the past. Whether this assertion conforms with the facts, is another question. Research could sometimes unmask errors in the historical statements of a traditional belief. However, this did not always explode the traditional doctrine. For the core of traditionalism is not real historical facts, but an opinion about them, however mistaken, and a will to believe things to which the authority of ancient origin is attributed."

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Obs. A Ratio Pro Libertas deseja esclarecer que todas as diferentes manifestações de opiniões de nossos estimados articulistas são de exclusiva responsabilidade dos mesmos, ainda que entenda que todo debate enrique a discussão de temas variados.

Voyeurismo cívico

Por Adriana Vandoni

Não sei vocês, mas minha preocupação e atual ocupação é saber quem será a próxima Matilde. Não penso em outra coisa desde que a coitada e inexperiente Matilde foi defenestrada do seu cargo num ritual satânico que a entregou como oferenda. Ah, vá lá, tinha que cair mesmo. Pô!, a mulher pagou mais diárias de locação de carro do que os dias do ano.

Visitar o Portal da Transparência passou a ser uma espécie de voyeurismo cívico. É constrangedor ver as preferências e hábitos das autoridades, mas mais constrangedor foi ver um ministro de estado explicando os motivos que o levaram a comer uma tapioca. Que mico!, tadinho, deve estar com depressão, com vergonha de sair à rua. Tá nada! Eu é que fico com vergonha. E o ministro da Pesca? Como uma voyeuristas, notei que ele gosta tanto de peixe, que prefere preservá-lo e quando vai comer, cai de boca num belo churrasco. Já disse que o nome da pasta deveria ser do Peixe, não da Pesca. Essas são as miudezas da falta de compostura de uma gente que vê o que é público como de ninguém. Culpa de Lula que disseminou secretarias e ministérios fúteis e inúteis em seu governo. Mas vale a pena praticar esse voyeurismo cívico, é diversão pura.

Matilde deposta, Matilde posta!, e vamos escolher quem será a próxima. A Secretaria apelidada de Ministério da Igualdade Racial, apesar da ênfase expressa na população negra, tem a função, não apenas de consolidar as diferenças entre brancos e negros, como fazia Matilde, mas seu objetivo é "promover a igualdade e a proteção dos direitos de indivíduos, grupos raciais e étnicos afetados pela discriminação e demais formas de intolerância". Ora, por etnia entende-se "grupo social diferenciado de outros, por laços peculiares de cultura, religião, língua, comportamento etc., e que compartilha origem e história comuns". Essa definição abre um leque de possíveis futuras Matildes.

Vamos às opções:

Lecy Brandão: a cantora teve seu nome aventado pelo jornalista Ancelmo Góis. Sobre ela, não tenho muito a declarar. Na verdade conheço apenas dois trabalhos de Lecy. Um foi transformar todo bairro em "comunidade" – é comunicada da mangueira, comunidade da vila Isabel..., e o outro trabalho foi uma ponta no programa eleitoral da vice-prefeita de Cuiabá.

Preta Gil: atriz, cantora, modelo, performática e filha do ministro Gil, foi lançada na coluna de Tutty Vasques, mas tem poucas chances. Sua indicação nasceu praticamente morta. É espetaculosa demais da conta e seu pai já é ministro, o que poderia ser entendido como nepotismo.

Naomi Campbel: essa teria fortes chances. Melhoraria a imagem de todo o governo Lula, já carregado de botox, e promoveria o governo internacionalmente. Além do mais, não acredito que usaria o cartão corporativo para comprinhas em freeshops. Tem um apelo fundamental, é muito amiga íntima do cumpanhêro Hugo Chávez. Contra a sua escolha existe o fato de não saber o português, detalhe facilmente superado depois de mas aulinhas com o mesmo professor de Mangabeira Unger.

Evilásio Caó: o pupilo de Juvenal Antena é um líder nato, fato comprovado quando foi presidente interino da Associação dos Moradores da Portelinha. Tem domínio das massas, penetração e experiência em inter-relação racial, aliás, este é o fator que pode pesar contra sua indicação, pois não sei até que ponto a pasta quer, digamos, esse aprofundamento na relação inter-racial.

Saindo do eixo "cor de pele", temos outros ministeriáveis:

Toni Reis: é presidente da ABGLT - Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais, tem feito um belo trabalho de sensibilização para o respeito à diversidade sexual e também sobre elucidação da AIDS. Ponto forte: presta contas de tudo que gasta na ABGLT.

Paulo Okamotto: seria uma inovação colocar um representante da comunidade japonesa e ainda por cima um que já foi o primeiro melhor amigo de Lula. Só tem um problema, Okamoto gosta de pagar tudo pra todo mundo, e nem avisa. Sabe, Okamotto é meu sonho de consumo! Mas, apesar de querer um Okamotto pra mim, acho que ele faria um strike com um cartão corporativo.

Raoni Metuktire: índio, tão famoso e fashion quando Naomi Campbel, tem até grife de bolsas e camisetas com seu nome. Seria um must no staff de Lula. Como já é um "indivíduo não governamental", gastar através do cartão não faria a menor diferença no nosso bolso.

Rabino Henry Sobel: este é o meu preferido. Sua atuação sempre foi marcada pela luta e combates pacíficos às diversas formas de intolerância política, religiosa e étnica. Sobel representa um marco no processo de democratização do país, maaaaaas... deu uma guinada na vida. A sua recente fase de antidepressivos o qualificou para assumir qualquer pasta no governo Lula, com a vantagem de não precisar de cartão corporativo algum para adquirir seus alfinetes. Basta mantê-lo com os remedinhos em dia.

Geeeente!!!!!, Peraê!, será que esses petistas andam tomando o remedinho antidepressivo do Henry?