1 de set. de 2006

João Ubaldo Ribeiro

"O objetivo de Lula não era acabar com a corrupção, mas assumir seu controle - e exatamente nos mesmos termos, com as mesmas práticas, as mesmas jogadas, o mesmo fisiologismo."
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E os ladrões de sempre, com suas quadrilhas organizadas há anos, ficaram enciumados. Valendo-se de suas sabedorias, leia-se jeitinho brasileiro, trataram de formar acordos com os novos quadrilheiros chefiados pelo comandante mor.
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É como no caso da Cosa Nostra. Nenhum Capo deixa que tome, que se aposse de seu pedaço sem alguma vantagem. Bem, no caso da Máfia (a Italiana) todo mundo sabe como é que as coisas são resolvidas. Mas os brasileiros são criativos.
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Na mesma tecla: Erva daninha propaga-se melhor em terreno já adubado, propício.
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Assisti pela enésima (??) vez a Os Intocáveis (The Untouchables) ... todos sabem!
..Brian De Palma
..Giorgio Armani
..Ennio Morricone
..Elenco
..Super Produção
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Al Capone foi parar na jaula - condenado a 11 onze anos - por sonegação fiscal. Sonegar o Imposto de Renda dá cadeia nos USA.
E, por um mixaria: refiro-me aos padrões brasileiros. O mesmo foi pego por não declarar uma movimentação de US$-1,3 milhão, em valores da época.
Quem rouba tal mixaria por aqui é ladrão de galinha.
Bem, o Pres. do Estados Unidos era Franklin Delano Roosevelt, e o chefe do FBI, a polícia federal america, era John Edgar Hoover.
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Temos por aqui o Luiz Ignorácio da Silva e o Márcio Contumaz Bastos. Todos, claro, criação de RA. Vivemos num país fictício: a Banânia.

Conceito e preconceito - by Paulo Zappi

Entre as muitas distorções intelectuais comuns no país das bananas, há uma que me irrita especialmente. Esta distorção é tão grave que acredito que seja uma das causas principais do baixo crescimento econômico de um país que deveria estar entre os maiores do mundo. Essa distorção deriva do uso errôneo da palavra "preconceito".

Pelo fato do brasileiro ser o resultado de uma incrível mistura de raças e origens nacionais sempre existiu o receio de que conflitos raciais surgissem e impedissem a convivência pacífica. Nunca houve um sistema de castas como o que perdura até hoje na India ou um regime de segregação forçada como o imposto pelo governo na Africa do Sul. O país das bananas sempre se caracterizou pela mistura. Uma vantagem é a diminuição de problemas raciais. Se o seu pai é negro e sua mãe é japonesa você não tem motivo para ter preconceito contra estas etnias.

Infelizmente, a miscigenação brasileira também se deu por permissividade excessiva. Talvez isso venha dos senhores de engenho que engravidavam as escravas, ou dos portugueses com as índias... A grande festa do carnaval é só o resultado: um festival do pode-tudo.

...Não quero saber a origem do Lula, já não faz a menor diferença de onde ele veio. O que importa é que ele não passou na prova. Na verdade, não só não passou, como mostrou de que material ele é feito. Já não faz sentido falar de preconceito.

A Esperança é a última que morre ...sacuméquié ...brasileiro

SEGUNDO TURNO, QUEM ACREDITA?
01.09, 15h01
por Guilherme Fiúza, do site NoMínimo

A diferença das intenções de voto em Lula para a soma dos outros candidatos está em 12 pontos percentuais a favor do presidente, segundo o Datafolha, última pesquisa divulgada. Mas pode haver distorções nessa leitura.

O número de votos nulos, brancos e abstenções tenderia a ser mais alto entre o eleitorado de Lula – menos instruído – e essa tendência as pesquisas não captam.

Se estiver certo o cálculo feito pelo prefeito e analista eleitoral César Maia, no dia da eleição esses “não-votos” serão o dobro do que as pesquisas mostram (ou seja, passando de 20% do eleitorado). E 80% desse aumento estariam entre os que hoje dizem que votarão em Lula.

O resumo da ópera é que os 12 pontos de vantagem do presidente sobre a soma dos outros seriam, na verdade, observadas essas projeções, apenas 4 pontos. Ou seja, o segundo turno estaria muito mais próximo do que parece.

Este seria o motivo, apontado por Alckmin, pelo qual o programa de governo do PT foi tão agressivo nas críticas ao governo FHC.

Pode ser ciência. Ou pode ser torcida. A resposta chegará em um mês.

Paulo Moura31.08, 17h39

por Paulo G. M. de Moura, cientista político

Faltam cerca de 30 dias para o fim do 1º turno. Os institutos Sensus e Datafolha convergem ao apontarem que Lula superou a marca dos 50% das manifestações de intenção de voto. Convergem, também, ao apontarem aumento da rejeição e pequena queda de Heloisa Helena, confirmando o que as pesquisas anteriores já demonstravam. Mas, divergem sobre os índices de Alckmin nas pesquisas e sobre os índices de aprovação do governo. Para o Sensus, a avaliação do governo Lula não caiu e Alckmin estaria estacionado na marca dos 19%. Para o Datafolha a avaliação de Lula caiu e Alckmin cresceu cerca de 2 pontos percentuais, indo de 25% para 27%.

Prefiro achar que o Datafolha está certo. Ao se comparar com Lula em sua propaganda, o candidato tucano começou a recuperar eleitores que havia perdido para Heloisa Helena. A face radical-sorridente da “candidata-Orloff” (eu sou o PT de ontem) do PSOL só agrada a quem votaria nulo ou aos petistas arrependidos. O eleitor antilulista conservador é de Alckmin e está voltando para casa.

Mas os 50% de Lula são de causar infarto na oposição. Sinto-me um náufrago perdido no meio do oceano por defender as posições que defendo aqui sem poder analisar pesquisas de monitoração da propaganda na TV e seus efeitos (tracking diário e grupos focais). Não vejo ninguém correr o risco de admitir em público que a estratégia de Alckmin pode estar certa. Minha intuição me diz que a opinião dos eleitores está se movendo por baixo da superficialidade dos números das pesquisas que fazem as manchetes lulistas.

Mas Lula já anuncia seu ministério. Cláudio Lembo atira a toalha antes da hora. As manchetes compram como verdade definitiva pesquisas que simulam uma votação que só ocorrerá daqui a 30 dias. Articulistas e líderes da oposição criticam Alckmin por ter deixado a corrupção de fora da agenda de uma eleição que não terminou.

Compreensível esse sentimento de desamparo de gente que entende a natureza autoritária do PT e quer ver Lula ser dura e frontalmente criticado por Alckmin, por suas omissões e/ou cumplicidades com a mega-corrupção que se instalou em seu governo. Sou solidário a esse sentimento. Mas prefiro ver Lula perder a apenas tomar pau na hora errada e vencer. Se eu estiver entendendo a estratégia de Alckmin, a hora de Lula tomar pau está chegando.

Na primeira fase da propaganda na TV, Alckmin foi apresentado a eleitores que não o conheciam. Segundo os manuais de marketing político e segundo minha percepção do tabuleiro dessa disputa, essa foi uma iniciativa necessária e correta. Nem mesmo Lula deixou de apresentar-se e de relembrar seu passado humilde aos eleitores. Há casos em que é necessário romper com a lógica dos manuais. Não me parece ser isso o que se impõe ao caso de Alckmin.

Como seria possível a Alckmin, desconhecido de uma parcela expressiva dos eleitores - especialmente dos eleitores do petista, de baixa renda e baixo grau de instrução, que vêem no “pai dos pobres” alguém que é “gente como a gente” - acusar Lula frontalmente de ter vendido a alma para o diabo para chegar e ficar no poder, sem fazer com que esses eleitores se sentissem agredidos? É preciso criar condições para isso. E é isso o que Luiz Gonzalez (marqueteiro de Alckmin) vem fazendo.

Depois de apresentá-lo aos eleitores, Gonzalez começou a estabelecer contrastes de estilo entre Alckmin e Lula. A queda da avaliação positiva do governo e o crescimento de Alckmin apontado pelo Datafolha pode ser um primeiro e ainda insipiente resultado desse segundo movimento da estratégia. No programa de TV do último dia 29 Gonzalez introduziu o primeiro ataque a Lula no terreno da ética. Hoje deve dar outro tiro. Mas, Gonzalez tomou o cuidado de desassociar o ataque do seu autor. O artifício consistiu de “encurtar” o programa de TV de Alckmin, que fechou alguns segundos antes com a vinheta que demarca seu fim, introduzindo um módulo de ataque no qual um personagem relembra aos eleitores a cronologia da corrupção no governo Lula e chama-os à reflexão. O recurso tático me parece correto e adequado ao objetivo dessa fase da campanha.

Com a elevação gradual do tom dos ataques na propaganda de Alckmin, é possível que mais eleitores antilulistas voltem para o candidato tucano. Mas, por mais alguns dias ainda, não será hora do “vazamento de lá para cá” a que fiz referência em meu último artigo. Observe-se que os críticos de Alckmin na oposição, que querem vê-lo jogar a corrupção na cara de Lula, ainda não estão totalmente satisfeitos. Mas, não é para conquistar o voto deles que Gonzalez pensou sua estratégia.

Se a propaganda negativa que os críticos de Gonzalez querem ver é a solução para derrubar Lula, ela pode prestar esse serviço daqui a pouco, como prestaria se fosse usada no início do horário eleitoral gratuito. Qual a diferença entre atacar Lula frontalmente antes, ou atacá-lo daqui apouco?

Ora, se um candidato desconhecido dos eleitores de cujo voto precisa, ataca frontalmente um candidato conhecido, que já é presidente da República e que é visto como “gente como a gente” e como “pai dos pobres” por esses eleitores, quem tende a levar a melhor? Comunicação é um bicho complexo, mas a lógica sugere que Lula levaria a melhor, tornando-se vítima de críticas percebidas como injustificadas aos olhos de seus eleitores, desinformados, deseducados e desmemoriados.

Em breve, as imagens das CPIs e as cenas gravadas de Waldomiro Diniz e do funcionário dos Correios pedindo e pegando propina; do dirigente petista admitindo ter levado um carro importado de segunda mão como propina da empresa GDK; da opressão sobre o caseiro da mansão dos horrores; das demissões de Zé Dirceu e Palocci; ou outras, virão ao ar acompanhadas de críticas diretas de Alckmin a Lula. Cenas de corrupção explícita não faltam ao governo Lula. Cesar Maia tem sugerido idéias ótimas para serem aproveitadas. Quando a hora chegar.

Repito, se peças de comunicação como essas funcionam para tirar votos de Lula, funcionariam antes como podem funcionar daqui a pouco. A diferença está no resultado de seu uso, na hora certa ou na hora errada. Bater desde o início poderia garantir o segundo turno, mas dificultaria a Alckmin tirar eleitores de Lula.

Os eleitores de centro que estão com Lula; óbvio, não são antilulistas. Podem mudar de candidato, desde que Alckmin consiga convencê-los que será melhor presidente, garantindo-lhes que vai preservar o “bolsa-esmola” e que, diferente de Lula, não é omisso, nem cúmplice, nem conivente com a corrupção. O voto dos antilulistas já é de Alckmin. Ou será no segundo turno. O objetivo de Gonzalez é tirar votos de Lula para Alckmin vencer e não apenas para ir ao segundo turno. Vamos ver se consegue.

Gosto do Paulo Moura. Admiro o seu pervicaz otimismo; a meu ver, uma aposta. Se o mesmo acertar, o país - num todo - ganha, a Democracia ganha.

Leia ainda PÓS-LULA: O BRASIL SAI DESSA PIOR, de 18/08/2005

Xô (Sarney) - do Claudio Humberto

Pesquisas já dão 30% à adversária do senador José Sarney (PMDB-AP).
A onda, agora, é o Amapá presentear o País “aposentando” Sarney.



Pesquisas já dão 30% à adversária do senador José Sarney (PMDB-AP).
A onda, agora, é o Amapá presentear o País “aposentando” Sarney.

O Extraterrestre - by Rodrigo Constantino


Com autorização do Rodrigo Constantino

“Tenho até dúvidas se a gente conseguirá fazer tudo, mas de uma coisa podem ter certeza: não será por falta de esforço, por falta de lealdade aos princípios que me fizeram chegar à Presidência da República que não vamos cumprir. Se a gente não cumprir, é porque houve fatores extraterrestres que não permitiu que cumpríssemos.” (Lula)

Eu já vi um OVNI. Mais de um. Não chegavam a voar, é verdade. Mas carregavam vida extraterrestre dentro. Tenho certeza! Um deles tinha um ser bem parecido com uma cadela, que desfilava com carro oficial do governo brasileiro e atendia pelo nome Michele. No outro, vinha o líder dos ETs. Bem parecido, ao menos na carcaça, com os seres humanos. A maior diferença perceptível é que continha 9 dedos apenas, em vez de 10. No restante, passaria tranqüilamente por um de nós. A visão humana é limitada, pode enganar. Mas sempre soube que tratava-se de um ET.

Esse ET vive entre os humanos faz tempo, e chegou a se disfarçar de operário – mas nunca gostou de trabalhar de verdade. Gostava mesmo de cachaça e bravatas. Creio que possa ser para melhorar a eficiência do disfarce. A política sempre o interessou. Após precoce aposentadoria, logrou chegar ao poder, depois de várias tentativas. Para tanto, apelou para um estelionato eleitoral. Não sei ao certo de qual planeta esse ET veio, mas com certeza não deixa nada a desejar em relação à malandragem que virou orgulho nacional por aqui. Pelo contrário: seria reitor na escola onde os malandros brasileiros estudaram...

Depois de usar a bandeira da ética para enganar inocentes úteis, rasgou a bandeira e ensinou aos escoteiros mirins de antes como se faz de verdade. Durante seu governo, tivemos de tudo: “mensalão”, sanguessugas, vampiros, dinheiro na cueca etc. O poder de hipnose do ET é elevado, e vem do seu carisma. Muitos inocentes úteis ainda idolatram o ET, e afirmam que o “mensalão” não foi inventado por ele. Ignoram que o “mensalão” é a pontinha do iceberg de corrupção montado durante seu governo, onde seus principais aliados foram acusados de vários crimes e tachados de “quadrilheiros” pelo isento Procurador Geral da República. O ET queria controlar a máquina estatal toda, no fundo.

O ET demonstra enorme ranço autoritário também. Deve ser normal no planeta de onde veio. As amizades com ditadores sempre foi algo comum para ele. Quando um jornalista disse que ele gostava de beber, seu impulso foi querer expulsar o sujeito do país. Entre seus projetos de governo, controlar a mídia sempre pareceu uma prioridade. O ET gosta de monólogos mas detesta dar entrevistas também. Recentemente fugiu de mais uma. Não quer dar explicações sobre os infindáveis casos de corrupção ocorridos bem diante de seus olhos alienígenas, que, quando interessa, nada enxergam. Deve ser uma característica de sua espécie, o olhar seletivo e a cegueira voluntária. Agora pretende ir além, e quer vetar na Justiça que seus opositores explorem na campanha as vastas cenas de corrupção do seu governo. O ET sempre detestou fatos!

Durante o governo do ET, o crescimento brasileiro foi pífio, mais que medíocre. O mundo todo voando como uma águia, e o Brasil tentando seu vôo de galinha – desajeitado, barulhento e sem altitude. Mas os inocentes úteis, autômatos como cães de Pavlov, celebram a mediocridade, e aplaudem o ET. Ganham um osso em troca. Ficam felizes. O ET sabe como domar os ignóbeis. O ET sabe como conquistar os sacripantas. O ET é apedeuta, não aprendeu a falar nossa língua direito, mas de bobo não tem nada. Bobos são aqueles que acreditam no ET.

Espero apenas que, tal como o ET de Steven Spielberg, esse ET consiga finalmente voltar para o lugar de onde veio. O problema é que o ET, com seu poder destruidor, matou até mesmo a esperança. Resta agüentá-lo fazendo estragos no nosso mundo por mais 4 anos...

Vive la merde!

O Brasil imperialista - por Arthur Chagas Diniz*

Há alguns anos, era comum entre a esquerda brasileira nomear os norte-americanos como “imperialistas”. Interessante é que quando caracterizavam o “imperialismo”, os comuno-socialistas se referiam, com grande ênfase, à produção no Brasil de investidores norte-americanos. Colgate, Gessy Lever, Palmolive, Johnson & Johnson, entre muitas outras, eram a maior evidência do imperialismo ianque. O capital estrangeiro – desde que norte-americano – era o principal agente do imperialismo.

O mundo mudou e hoje empresas e empresários brasileiros investem no exterior US$ 95 bilhões, mais ou menos – a metade do investimento norte-americano aqui registrado. Isso é bom? É ruim?

O capital busca sempre a melhor remuneração, considerada dentro dela a variável risco. O Brasil ficou caro. E, mais do que caro, instável. Ficou barato investir fora, diretamente ou através de paraísos fiscais. Ficamos (Brasil) cada vez mais caros e mais fracos institucionalmente.

É ruim que o investidor brasileiro construa fábricas no exterior? Não, mas seria melhor se ele se sentisse estimulado a investir no Brasil e exportar seus produtos. Ocorre que o excesso de impostos, a taxa interna de juros, a legislação trabalhista, a instabilidade institucional e a supervalorizada taxa de câmbio fazem o capital migrar e, com isso, não se criam novos empregos na indústria.

O chamado “setor terciário” que, teoricamente, deveria absorver a mão-de-obra dispensada pela indústria, cada vez mais produtiva, precisa de um período de adaptação que, para boa parte dos trabalhadores, é quase impossível realizar.

Os políticos brasileiros, qualquer que seja o seu matiz ideológico, precisam levar em conta que o capital é apátrida e que ele sempre vai buscar a melhor remuneração e o menor risco institucional. A corrupção, às vezes, ajuda a realizar alguns negócios, mas, quando é sistêmica, eleva os custos de transação e é, portanto, indesejável. A burocracia brasileira é uma das quatro ou cinco piores do mundo em termos de velocidade. Reduzir impostos sem cortar custos correntes é absolutamente impossível, já que, virtualmente, o governo não investe em capital fixo (estradas, hidrovias, portos, usinas, etc.) e dificulta a entrada de investidores privados.

Existem, até hoje, pessoas no Governo que acreditam que a privatização da telefonia e a concessão à exploração de estradas de rodagem foram crimes de lesa-pátria.

É neste país de contrastes que o Brasil imperialista (investidor externo) busca sua inserção na economia internacional.

* Presidente do Instituto Liberal.

Direito ao Mau Gosto* - por Manuel Menezes de Sequeira

O DL 176/98, constitutivo da Ordem dos Arquitectos (OA), decreta que é sua atribuição “admitir e certificar a inscrição dos arquitectos, bem como conceder o respectivo título profissional”, e que “só os arquitectos inscritos na Ordem podem [...] usar o título profissional de arquitecto e praticar os actos próprios da profissão”. À luz deste decreto, e sobretudo de um suposto “direito à arquitectura”, a OA vem defendendo a revogação do DL 73/73, que permite o exercício da profissão por não arquitectos.

Mas o que é o “direito à arquitectura”? Não se trata do direito a exercer arquitectura, a projectar e a edificar, nem tão pouco de conferir esse direito, já existente, aos membros da OA. Trata-se, sim, de conferi-lo exclusivamente aos membros da OA. Sendo esta interpretação politicamente inconveniente, a OA tem usado a expressão sobretudo na acepção de direito de todos à arquitectura. A retórica é a de que existe um interesse geral, um “direito colectivo”, que colidiria e se sobreporia ao direito de cada um escolher a quem entrega o projecto da sua habitação.

Não existe tal “direito colectivo”. Há cidadãos que, na sua liberdade, pretendem exercer uma das mais antigas actividades humanas, como a presidente da OA reconheceu em 21 de Maio de 2003, na discussão na AR da petição sobre o “direito à arquitectura”: “todas as famílias trazem consigo [a disponibilidade para a construção], na vontade de construir o seu abrigo, a sua casa”. Há também arquitectos, que pretendem exercer a sua profissão em igual liberdade. Ambas as liberdades, a do cidadão comum que pretende erguer um edifício e a do arquitecto que pretende exercer a sua profissão, são garantidas pela legislação actual. Os clientes podem escolher o técnico que entenderem para projectar os seus edifícios, os arquitectos podem instalar-se onde quiserem e dedicar-se a projectar.

No texto da petição diz-se que o “direito à arquitectura” é “decorrência lógica dos Direitos à Habitação e Urbanismo e ao Ambiente e Qualidade de Vida consagrados na Constituição da República Portuguesa”. O Artigo 65º da Constituição afirma que todos têm "direito [...] a uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar". Se a consagração destes direitos na Constituição é em si mesma discutível, não é menos verdade que eles são compatíveis com o DL 73/73, pois os arquitectos não são os únicos capazes de projectar habitações nas condições indicadas. Mesmo que o fossem, não se poderia com isso justificar a obrigatoriedade da assinatura de arquitecto nos projectos, pois não faz sentido impor um direito a quem dele beneficia: tratar-se-ia da pior forma de paternalismo político.

A defesa da liberdade individual face a um falso direito colectivo é suficiente para rebater a intenção da OA. No entanto, vale a pena também analisar a ideia de que a qualidade arquitectónica aumentaria com a obrigatoriedade da assinatura de arquitecto. Sendo verdade que muitos dos edifícios em Portugal não podem considerados como arquitectura e que muitos deles não têm projecto de arquitecto, não é menos verdade que há muitos edifícios de arquitectos que também não podem ser classificados como arquitectura. Cito em segunda mão José Augusto França (Diário de Notícias, 2002/12/22):

No domínio da arquitectura, a palavra [mamarracho] pode ser empregue porque muitos mamarrachos se têm edificado, como é inevitável, por incúria de várias câmaras municipais e também por falta de talento de muitos arquitectos e de gosto da maior parte dos clientes.

Em última análise é o gosto do cliente que determina o que uma obra será, mesmo se a sua escolha for limitada pela lei. Creio por isso que a revogação do DL 73/73 iria redundar num acréscimo da clientela dos piores arquitectos, dos que respondem de forma acrílica aos clientes e que de arquitectura possuem apenas um diploma. Creio ainda que a qualidade arquitectónica jamais melhorará por decreto. Mas, mesmo admitindo que creio erradamente, a revogação do DL 73/73 proposta pela OA constituiria uma violação de um direito básico dos portugueses: o direito a ter mau gosto e a exercê-lo.

Março de 2005

*originalmente publicado no semanário Domimgo Liberal