16 de jul. de 2006

Uma providência prática é democratizar os partidos; se preciso, à força

O ex-ministro da Justiça (governo Collor) Célio Borja, um liberal de carteirinha, dá longa entrevista a O Estado de S.Paulo, para falar dos riscos à democracia. A certa altura, ele discorre sobre o que deveria ser feito para democratizar a política e os partidos. Transcrevo:

"OESP - Se os partidos perdem seu papel, para que tipo de democracia estamos caminhando?
CB - Eu sempre me perguntei isso. Será que a democracia é tributária dos partidos? Não é possível que haja outras formas de participação sem eles? E qual a resposta para tudo isso? Não a tenho. Só posso constatar que o partido se transformou em um clube, onde se paga umamensalidade, mas participar mesmo, deliberar, é para uns poucos. Só vejo uma saída, a de voltarmos à absoluta liberdade de organização política. Acabar com qualquer forma de regulamentação dos partidos. Não regular nada, nem agora nem depois. Acabar com a dependência, como os fundos partidários. Tudo o que está aí foi construído a partir da idéia de que a liberdade não é propriamente a virtude da democracia – privilegiou-se em alguns lugares a fraternidade, em outros, a igualdade. E nunca a liberdade. E, no entanto, ela é a alma da democracia. Temos de refazer a experiência da liberdade."

Célio Borja está certo no diagnóstico e errado na terapêutica. Não existe candidato avulso no Brasil. Para disputar democraticamente o poder, o sujeito precisa pertencer a um partido. Portanto, a liberdade absoluta aos partidos não é garantia de democracia para os cidadãos, mais parece um caminho para a partidocracia, que é o que temos hoje. Vivemos no pior dos mundos. Os partidos recebem dinheiro público, diretamente e por meio do horário gratuito em rádio e TV, mas não têm obrigação de serem democráticos. O presidente do partido pode intervir quando quiser em qualquer diretório e as legendas podem disputar as eleições mesmo que tenham apenas comissões provisórias. A "absoluta liberdade de organização política" levou a isso. Eu penso diferente. Deveria haver leis que obrigassem os à democrcia interne. Seus dirigentes deveriam ser eleitos diretamente pelos filiados, em eleições internas organizadas pela Justiça Eleitoral. Onde houvesse apenas comissão provisória, o partido deveria ser proibido de concorrer. Deveriam ser vetadas por lei a intervenção e a dissolução de diretórios. Essa idéia de que a democracia nasce da liberdade absoluta é uma miragem, não tem base histórica. De novo, mostra os limites do pensamento liberal para enfrentar os problemas concretos da política.

Copiado do Blog do Alon

O BRASIL AMA O CAOS - Blog do Josias de Souza

Em respeito aos cadáveres produzidos pela onda de violência que engolfa o cotidiano de São Paulo a nação deveria responder a algumas perguntas cruciais: quando começa o caos? Será que já começou? Teria o país realizado o desejo que persegue desde 1500?

Foge-se das respostas por medo de que elas conduzam à grande revelação. Que levem à verdade irrefutável. Que guiem à percepção de que o Brasil encontrou-se, finalmente, com o insondável. É uma pena. Corre-se o risco de deixar escapar a última chance para recomeçar do zero. Da capo, como dizem os músicos.

Se era de caos que o país precisava para construir um recomeço, haveria matéria-prima de sobra. A lógica deveria dar a luz a um entendimento. Mas a política, parafuso espanado que rodopia a esmo, não segue a lógica.

A lógica pede um compartilhamento de culpas. E, como sabem todos, ninguém é culpado pelo caos. Ou, por outra, todos são culpados, menos o último entrevistado. O caos é sempre culpa do outro. Não há quem se disponha a partilhar o caos.

De resto, um eventual entendimento deixaria os gestores do caos sem ter o que debater. Se o caos fosse eliminado eles seriam forçados a se dedicar a tarefas menores. Trabalhar, por exemplo. A resolução do caos transformaria o Brasil num tedioso inferno de problemas resolvidos.

O fim do caos também não faria bem à religião. Edir Macedo não teria mais demônios a exorcizar. E a manutenção da mansão de Miami ficaria comprometida. O extermínio do caos não dá lucro. Que seria da indústria de grades, de porteiros eletrônicos e de alarmes sem o caos? A que reengenharias teriam de se submeter as firmas de segurança privada, muitas delas comandadas por ex-comandantes da polícia?

A eliminação do caos também não interessa à academia. O caos é a musa dos intelectuais. Proporciona-lhes uma reconfortante sensação de utilidade. Dá-lhes boa consciência. Sem o caos, faltaria inspiração para as grandes teses. Haveria uma legião de doutorados no inócuo.

A imprensa tampouco se interessa pelo fim do caos. Sem a ameaça à ordem social, os Jornais não teriam o que pendurar nas manchetes. O caos dá às primeiras páginas a estética da urgência que seduz os leitores. Artigos como esse que você está lendo perderiam o sentido.

Como a ninguém interessa acabar com o caos, resta ao Brasil cumprir o seu destino de nação inviável. O caos eterno é a prova de que países também podem ficar de miolo mole, sair do sério e cometer suicídio. O Brasil é a inviabilidade "full time". Por sorte, o país é feito à base de caos. Se fosse feito de lógica, faltaria material.