20 de mar. de 2008

Frases, ditos suspeitísssimos...

Onde vejo escrito - comum em parachoques de caminhões, adesivos em veículos, etc., - as frases, ditos abaixo, tenho 99,99% de certeza que há um PILANTRÃO por trás:
  • Deus é fiel.
  • Jesus é fiel.
  • Propriedade do Senhor Jesus.
  • Senhor abençoe este lugar.
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  • Não dá pra enumerar o monte de asneiras. Os autores ou quem mandou escrever as asneiras - podem crer -, é um pilantrão da pior espécie. No mínimo um mal educado, um grosseiro dos grandes.

Made in China: repressão

A China é um mito em crescimento chinês. Sinônimo de dinamismo e força, o gigante asiático tornou-se a fábrica do mundo com sua acelerada revolução industrial pós-moderna: a Inglaterra do século 18 de volta para o futuro do século 21.

Milhões e milhões deixam a zona rural chinesa e engrenam nas manufaturas globais. Trabalham sem parar em busca de salários magros que enchem os bolsos dos industriais chineses e estrangeiros.

Todos lucramos na operação China. Explorando sua farta mão-de-obra, vendendo nossas commodities ao seu imenso mercado, comprando importados baratos.

Justamente um país comunista tornou-se peça-chave do capitalismo global com sua bem organizada exploração do proletariado chinês, que segura a inflação no mundo. Suas reservas cambiais, já no trilhão de dólares, ainda financiam os EUA e resgatam seus bancos podres.

O mundo agradece a essa explosão de vigor, que nos impulsiona. Talvez seja isso que explique a tolerância com os abusos aos direitos humanos da ditadura comunista, que deveriam nos causar repulsa.

A revolta em curso no platô tibetano, pelas ruas de Lhasa e outros centros, e a dura repressão chinesa expõem, apesar da censura de ferro, a face escura do milagre chinês, um regime de partido único que não tolera dissensão.

O caso tibetano é comovente, caro a estrelas de Hollywood, intelectuais e humanistas em geral. O Dalai Lama esteve em São Paulo em 2006 e lotou o Ginásio do Ibirapuera com sua mensagem pacifista. Reencarnação do Buda da compaixão na tradição do budismo tibetano, ele já desistiu de obter a independência do jugo chinês e trabalha por mais autonomia aos tibetanos.

A China ocupa o Tibete desde 1950. O Dalai Lama fugiu ao exílio indiano em 1959 após sangrenta revolta ser reprimida pelos chineses.

Antes dos comunistas, a região era muito pobre, um regime de castas desigual e teocrata. Pequim investiu bilhões no Tibete, inaugurou no ano passado a "ferrovia mais alta do mundo", ligando o platô isolado às massas chinesas, e inundou as cidades tibetanas de chineses da etnia han, protegidos pelo regime e odiados pelos locais, que denunciam um genocídio cultural.

O Partido Comunista Chinês ainda advogou a si o direito de nomear os altos lamas, interferindo na sucessão do Dalai Lama, tentando dividir seus seguidores. Apesar de se dizer disposta ao diálogo, a China para alguns analistas na verdade ganha tempo até que o carismático Dalai Lama saia de cena e sua causa desidrate.

Talvez por isso a revolta desesperada dos tibetanos, que levou a China a reforçar ainda mais as duras restrições aos jornalistas estrangeiros e à internet: as transmissões da CNN e da BBC chegaram a ser interrompidas no país.

Os tibetanos querem aproveitar a proximidade das Olimpíadas para chamar a atenção global. Os Repórteres sem Fronteiras, a ONG que defende jornalistas, propôs um boicote à transmissão de abertura das Olimpíadas de Pequim, marcada para 8/8/8.

O cineasta Steven Spielberg já tinha abandonado sua ligação com os jogos em protesto contra o apoio chinês ao regime do Sudão, fornecedor de petróleo a Pequim e acusado de cumplicidade na matança de milhares de pessoas em Darfur. Sentindo o golpe, pouco depois um diplomata chinês apareceu em Cartum pedindo mais atenção do governo sudanês aos conflitos na região.

Assim como outras potências no passado, a China quer usar as Olimpíadas para projetar poder global. Por isso, está vulnerável. Não quer alimentar atritos, pode ceder a pressões. Este é o raciocínio da revolta tibetana. Mas o pavor de Pequim a agitações separatistas predomina.

Projeções de alguns economistas indicam que a China passará os EUA como maior economia do mundo nos anos 2020. Essa emergência trará abalos sísmicos à ordem mundial. Estrategistas americanos sugerem que a melhor forma de acomodação com o gigante chinês seja trazê-lo à moldura institucional criada pelo Ocidente desde o pós-guerra: FMI, ONU, Banco Mundial, OMC.

Roosevelt já pensava assim quando brigou com Churchill para que os chineses fossem membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU. Sabia do destino manifesto da China.

Para onde for a China irá ao menos o entorno asiático. Sua política precisa caminhar atrás de sua economia, para a abertura. É um caminho difícil.

Em 1997, entrevistei em São Paulo Samdhong Rinpoche, então presidente do Parlamento do governo do Tibete no exílio. "Não é correto dizer que a China está ficando mais forte", errou ele há dez anos. "Na verdade, a China está ficando mais fraca. O crescimento econômico chinês é artificial, baseado no uso de mão-de-obra quase escrava. O compromisso ideológico chinês está se perdendo. A economia de mercado e o regime político totalitário não podem conviver para sempre. Isso é uma grande contradição. O movimento pró-democracia está crescendo."

O movimento democrático não cresceu, mas a equação de Rinpoche pode trazer resultado via crescimento econômico. A massa urbana assalariada já exige mais direitos, a internet atinge 200 milhões de chineses, 700 milhões votam em eleições nos vilarejos rurais.

Todos ganharemos se a China seguir a trilha democrática. "Se a China se tornar uma democracia, o Tibete ganhará autonomia", disse Rinpoche em 1997.

Os tibetanos cansaram de esperar. Estão gritando ao mundo, desesperados, mas o barulho da locomotiva chinesa (e de seus tanques) os abafa.

Sérgio Malbergier é editor do caderno Dinheiro da Folha de S. Paulo. Foi editor do caderno Mundo (2000-2004), correspondente em Londres (1994) e enviado especial a países como Iraque, Israel e Venezuela, entre outros. Dirigiu dois curta-metragens, "A Árvore" (1986) e "Carô no Inferno" (1987). Escreve para a Folha Online às quintas.
E-mail: smalberg@uol.com.br

O analfabeto e Deus

Assisti no Jornal Hoje, da Globo, reportagem sobre um concurso público que foi anulado por fraude - uma novidade 'nestepaíz' -, no qual um analfabeto foi aprovado.

Entrevistado por uma repórter o mesmo afirmou que foi ajudado, recebeu ajuda de Deus. Que Deus assim o quis.

Diz-se que Deus criou o homem à sua imagem e semelhança.

Os brasileiros privatizaram-no às suas necessidades e pilantragens.

Usam o pobre coitado para tudo:
  • não dá pra enumerar.
  • é Deus para tudo.
  • sei que em prisões os detentos têm horários de orações. Logo após esses "sagrados momentos" partem para discutir os planos do que farão após saírem de suas detenções, especialmente os que estão em delegacias, passando por prisões de curta duração.

Luzes e sombras


O processo inquisitorial de Galileu é uma chave crucial de nossa interpretação da modernidade. A narrativa do confronto prometéico entre a ciência, que é progresso e luz, e a religião, que é retrocesso e sombras, está inscrita na nossa mente como uma tinta indelével. É por isso que nos surpreendemos diante da informação de que Charles Darwin consolidou seu interesse pela história natural enquanto estudava teologia em Cambridge - e mais ainda ao sabermos que escreveu A Origem das Espécies como um crente em Deus. Todos nós, e não só os comunistas, encaramos com certa naturalidade a curiosa metáfora de Karl Marx, que identificou a revolução como “locomotiva da História”, porque tendemos a admitir que há uma História, assim, com maiúscula, cuja trajetória se acomoda aos trilhos da ferrovia do futuro. O culto ao progresso, que é antes de tudo um culto à razão científica, configura a religião pagã da modernidade.

Os pólos da narrativa caricatural da modernidade emergiram na forma dos dois inquisidores da polêmica sobre as pesquisas com células-tronco embrionárias. O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, alertou para a inauguração de uma “época do obscurantismo e do atraso” caso o STF venha a julgar inconstitucionais as pesquisas. Já o ex-procurador-geral da República Claudio Fonteles reiterou a tese da Igreja segundo a qual a vida está presente na “célula autônoma” que “surge, por movimento de dinamismo próprio, independente de qualquer interferência da mãe ou do pai”. Atrás das posições polares se adivinham os contornos da próxima guerra de valores, que será sobre o aborto.

Será uma lástima se o debate público cair prisioneiro na armadilha de dois fundamentalismos. O articulista Reinaldo Azevedo, um católico, sugere que há espaço para nuances. Ele aceita, com relutância, a permissão das pesquisas com células embrionárias, mas se opõe por princípio à legalização do aborto. No seu blog, chama a atenção para a intervenção da bióloga Mayana Zatz, que estabelece uma distinção essencial. “No aborto, há uma vida dentro do útero de uma mulher. Se não houver intervenção humana, essa vida continuará. Já na reprodução assistida, é exatamente o contrário: não houve fertilização natural. Só há junção do espermatozóide com o óvulo por intervenção humana. E, novamente, não haverá vida se não houver uma intervenção humana para colocar o embrião no útero.”

A CNBB elevou o combate ao aborto à condição de eixo de sua Campanha da Fraternidade. Sob o sistema político que a separa do Estado, a Igreja fala legitimamente para os seus fiéis - e exprime um fundamentalismo que concerne à sua própria natureza. O ministro Temporão, por outro lado, é um agente do Estado, do qual se espera alguma coisa diferente da militância política fundamentalista. Quando ele se veste com a fantasia de porta-voz da ciência e, em nome da saúde pública, afasta liminarmente as objeções éticas levantadas pelos religiosos, revela apenas a estupidez da razão.

Sob Temporão, a esfera da saúde pública foi isolada, por uma muralha de insensatez, das esferas da moral e da cultura. Um experimento do programa de DST/aids instalou em escolas públicas máquinas de distribuição de preservativos para adolescentes a partir dos 13 anos, enquanto os postos de saúde oferecem pílulas do dia seguinte a jovens da mesma faixa etária. As iniciativas passam por cima de prerrogativas das famílias, mas as críticas dirigidas a elas são fulminadas pelo ministro como meras expressões de moralismo anacrônico.

Os totalitarismos do século 20 se engajaram no culto à ciência e, paralelamente, nos projetos de abolição ou estatização da religião. Na URSS, a psiquiatria oficial definiu como distúrbio paranóico as idéias de luta pela verdade e pela justiça e os dissidentes foram internados em hospitais para doentes mentais. Na Alemanha, o teísta Hitler deflagrou o empreendimento eugênico de fabricação da raça pura. As sociedades democráticas separam a política da religião, mas não convertem a ciência num imperativo absoluto, incorporam ao debate público os valores de ordem ética e refletem sobre o sentido moral dos princípios religiosos.

A tentação da eugenia se esconde atrás da manipulação de células embrionárias e, por isso, há um nítido interesse público na regulamentação dessa esfera da atividade médico-científica. A crítica ética ao aborto não é uma manifestação medieval de “homens conservadores que prescrevem como a sociedade deve controlar o corpo das mulheres”, na frase do ministro-militante, mas um componente da indagação existencial dos seres humanos. Temporão parece incapaz de entender isso - que, no entanto, é claro não apenas para religiosos, mas também para agnósticos.

O ministro da Saúde se distingue positivamente sobre o pano de fundo de um Ministério nascido no caldo do fisiologismo. O médico sanitarista e planejador de saúde pública declarou, na hora da posse: “O Ministério da Saúde vai fazer política de Saúde; não fará política na Saúde.” A sua cruzada pelo aborto, contudo, é exatamente “política na Saúde” - e má política. Há argumentos ponderáveis para sustentar uma flexibilização da legislação sobre o aborto e o próprio Temporão apresenta alguns deles. Mas não é seu papel atuar como ideólogo hipnotizado por certezas absolutas, que desqualifica sem cessar a opinião divergente.

Desconectado da realidade cultural brasileira, Temporão declarou que a descriminalização do aborto, um fenômeno essencialmente europeu, é “uma tendência mundial”. Em novembro, seu Ministério se articulou às ONGs feministas para fazer aprovar um relatório pró-aborto na 13ª Conferência Nacional de Saúde, mas uma ampla maioria de participantes derrotou a proposta oficial. Agora, sua cruzada pode arrastar o País para um plebiscito cheio de som e fúria, cujo desenlace só o ministro não adivinha.

Demétrio Magnoli é sociólogo e doutor em Geografia Humana pela USP.
E-mail: demetrio.magnoli@terra.com.br

Bolsa mesada

por Editorial da Folha

(Leia também "Bolsa marmita", por Maria L. V. Barbosa)

O atalho que leva do salvacionismo ao assistencialismo, no governo Lula, já se encontra mais que batido. A extensão do Bolsa Família, que passa a pagar R$ 30 para jovens de 16 e 17 anos, é só um eco distante -mas de imediato rendimento eleitoral- do programa Primeiro Emprego, lançado com fanfarra em 2003 só para esboroar-se em fracasso retumbante.

Foram necessários quatro anos para o Planalto desistir em definitivo da meta ambiciosa de abrir aos jovens 500 mil vagas com repasses de R$ 1.500 anuais a empresas dispostas a empregá-los. Só 15 mil postos foram criados. Segue descumprido o objetivo de qualificar os adolescentes para que consigam entrar e manter-se no mercado de trabalho.

Em seu lugar, a administração petista repaginou a idéia, em 2005 e 2007, com o Projovem (Programa Nacional de Inclusão de Jovens). Fato excepcional para seu estilo, o Planalto recorreu a um projeto de lei (nº 2.204/ 2007) -e não a mais uma medida provisória, como de hábito- para nele incluir a mesada de R$ 30 aos adolescentes.

O pretexto é fazer com que continuem na escola numa faixa etária em que se acentua a evasão, a passagem do ensino fundamental ao médio. Exige-se, para tanto, freqüência de 75% das aulas ao 1,1 milhão de jovens beneficiados de imediato (estima-se em 1,7 milhão o total dos que satisfazem os critérios). Bastam três bimestres abaixo dessa freqüência para perder o benefício.

Não é o caso, claro, de questionar o espírito humanitário de programas como o Bolsa Família. O que se objeta é seu caráter apenas anestesiador, o fato de não contemplar a chamada porta de saída -uma real emancipação socioeconômica, em que a ajuda seja só temporária, enquanto os beneficiários são preparados para melhorar sua renda por meio do emprego. Apenas receber o estipêndio pouco influi no aprendizado e na qualificação dos jovens, pois isso depende mais da capacidade da escola de dotá-los de aptidões úteis.

Trata-se de algumas gotas de assistencialismo num oceano de desqualificação e desalento juvenis. Resta para explicar a medida, portanto, sua evidente rentabilidade eleitoral, para a qual o governo federal oferece negativas débeis e provas robustas. Isso se torna patente com o fato de o governo ter desistido de introduzir o donativo por projeto de lei e ter optado, no apagar de 2007 (28 de dezembro), pela via fácil da medida provisória (nº 411).

Era imperioso evadir-se dos preceitos da lei nº 11.300/2006, que proíbe novos "bens, valores ou benefícios" em ano de eleições. O governo Lula alega que apenas estende um programa existente, o Bolsa Família, que o número de domicílios agraciados não se ampliou e que o benefício não será pago aos jovens eleitores, mas a seus pais.

Tais argumentos são tão afrontosos quanto irrelevantes. Sem urgência em aumentar a mesada dos pobres que beneficia em sua política paternalista, Lula poderia bem aguardar a tramitação do projeto de lei.