30 de ago. de 2006

Jefferson Péres renuncia à vida pública e critica o povo

Blog do Noblat

Com mais quatro anos de mandato a cumprir e a eleição para a Presidência da República a disputar na condição de vice do candidato Cristovam Buarque, o senador Jefferson Peres (PDT-AM) anunciou há pouco em discurso no plenário do Senado que abandonará a vida pública com a reeleição iminente de Lula.

- Estamos aqui no faz-de-conta. Como disse o Ministro Marco Aurélio (presidente do Tribunal Superior Eleitoral), este é o país do faz-de-conta. Estamos fingindo que fazemos uma sessão do Senado, estamos em casa sem trabalhar. Estou em Manaus há quase um mês recebendo sem fazer nada para o Congresso Nacional.

- Como se ter animação em um país como este com um presidente que, até poucas semanas atrás, até poucos meses atrás, era sabidamente – como o é – um presidente conivente com um dos piores escândalos de corrupção que já aconteceu neste país e este presidente está marchando para ser eleito talvez em primeiro turno?

- É desinformação da população? Não, não é. Se fizermos uma enquete em qualquer lugar deste país, todos concordarão ou a grande maioria que o presidente sabia de tudo; então votam nele sabendo que ele sabia. A crise ética não é só da classe política, não, parece que ela atinge grande parte da sociedade brasileira.

- Ele vai voltar porque o povo quer que ele volte. A democracia é isso. Curvo-me à vontade popular, mas inconformado. Esta será uma das eleições mais decepcionantes da minha vida. É a declaração pública, solene, histórica do povo brasileiro de que desvios éticos por parte de governantes não têm mais importância

- (...) Vou continuar protestando sempre, cumprindo o meu dever. Isso não seria justificativa para dizer que não vou fazer mais nada. Vou cumprir rigorosamente o meu dever neste Senado até o último dia de mandato, mas para cá não quero mais voltar, não.

- Um país que tem um Congresso desse, que tem uma classe política dessa, que tem um povo desse. Senador Antonio Carlos Magalhães, dizem que político não deve falar mal do povo. Eu falo, eu falo. Parte da população que compactua com isso, é lamentável. E que sabe, não é por desinformação, não. E que não é só o povão, não, é parte da elite, inclusive intelectuais.

- Compactuam com isso é porque são iguais, se não piores. Vou continuar nessa vida pública? Para quê?, Senador Antonio Carlos Magalhães, que é um pouco mais velho do que eu e vai continuar ainda. Mas, para mim, chega.

Falou pouco, mas falou tudo!

Perigosa Segregação - por Rodrigo Constantino

A existência de uma classe média é fundamental para evitar que democracia vire sinônimo de ditadura das massas. Nos países desenvolvidos, a formação de uma grande classe média tem impedido com razoável sucesso que governantes abusem do poder de forma grotesca, diferente do caso de uma Venezuela, onde um povo segregado entre os muito ricos e os muito pobres acaba vítima do populismo autoritário de um Hugo Chávez da vida.

Em Política, Aristóteles levantou diversos riscos da democracia, e percebeu também que esses riscos seriam mitigados em uma sociedade com grande classe mediana, sem muita desigualdade, e mais educada. Ele lembrou que “em toda parte onde uns têm demais e outros nada, segue-se necessariamente que haja ou democracia exacerbada, ou violenta oligarquia, ou então tirania, pelo excesso de uma ou de outra”. Portanto, os riscos da democracia são ainda maiores nas sociedades muito desiguais, posto que a massa fica ainda mais suscetível à manipulação dos demagogos, que concentram poder quase ditatorial.

Infelizmente, o Brasil parece estar caminhando rapidamente para este cenário. Com uma carga tributária beirando os 40% do PIB e uma burocracia asfixiante, é a classe média que paga o grosso da conta, pois não dispõe de mecanismos para fuga. Os muito pobres nada têm para entregar, e os muito ricos acabam locupletando-se com os políticos poderosos. O modelo estatal hipertrofiado tem segregado o povo brasileiro, praticamente condenando a classe média à extinção. Trata-se de um perigoso quadro, favorável para radicais revolucionários, tais como o MST. Para reverter essa perigosa segregação, só mesmo reduzindo drasticamente o maior concentrador injusto de renda: o Estado. Caso contrário, o pouco que restou da classe média poderá sentir saudades até de Lula um dia, quando Pedro Stédile lograr a tomada do poder...

A Consagração da Merda - por Clóvis Rossi, na Folha de SP

Pegou e fez escola a sociologia política da merda, exposta inicialmente pelo ator Paulo Betti para justificar a crise ética do governo Lula. Betti disse, curto e bem grosso: "Não dá para fazer [política] sem botar a mão na merda".

Uma semana depois, Lula repete, menos grosso, mas rigorosamente com o mesmo sentido: "Política a gente faz com o que a gente tem. Não com o que a gente quer". E, em seguida: "Maioria a gente constrói pelo que a gente tem ao nosso lado.

Não pelo que a gente pensa que tem. Esse é o jogo real da política que precisou ser feito em quatro anos para que chegássemos a uma situação altamente confortável".

Não é que seja novidade ou surpresa. Novidade é o fato de que quem se dizia monopolista da ética agora assume gostosamente a mais cínica versão do que é política.

De quebra, desconstrói as versões anteriores, a da "conspiração das elites" e a do "fui traído", que todo mundo sabia que eram ficções, mas que foram sustentadas ao longo de toda a crise. Não houve traição, confessa agora Lula. Houve "o jogo real da política que precisou ser feito". Leia-se: o mensalão (para não falar em outras atividades, tipo sanguessugas, que também envolvem figuras graúdas do lulo-petismo).

Compare-se o Lula de hoje com o Lula do seguinte trecho de seu discurso de posse: "O combate à corrupção e a defesa da ética no trato da coisa pública serão objetivos centrais e permanentes do meu governo. É preciso enfrentar com determinação e derrotar a verdadeira cultura da impunidade que prevalece em certos setores da vida brasileira".

Pronto, está demonstrado o estelionato eleitoral praticado em 2002. Vai-se repetir agora, ao que tudo indica, mas já não como estelionato. O eleitor está informado que o presidente botou a mão na merda. Mas não se importa.