19 de ago. de 2006

Um professor, um "tucanófilo" e dois tumores - por RA

Muita gente não gostou da minha reação a Paulo Moura, que me chamou de “tucanófilo” num texto. Cito o nome, o que não havia feito no texto original, porque ele próprio se identificou. E há também quem tenha aprovado. Bem, vou dizer o quê? “Tucanófilo” quer dizer, no mínimo, “amigo dos tucanos”, para ser simplesinho. No ambiente do debate político e ideológico, implica estar a serviço de alguém e ser um articulista cujo viés sempre interessa aos tucanos. E eu sou amigo da verdade, não de tucanos. Até porque, quando vocês conseguirem identificar o que é o pensamento tucano, me avisem. Basta ver o que escrevi sobre a tática de Aécio Neves.

Prepotência? Não. Eu me disse “amigo da verdade”, mas não da verdade universal. Apenas da minha. Do que enxergo. Não penso em bloco. Não pertenço a clube. Tenho horror ao espírito de manada. Não acredito nem em artigo escrito a quatro mãos. Se notarem bem, nem mesmo busco dar sotaque científico, sociológico que seja, ao que penso. Quando cito alguém ou alguma teoria, é para dizer a referência com a qual estou lidando. Um instrumento a mais para o leitor.

Uma das razões por que Primeira Leitura fechou as portas era a sua fama, pespegada pelo PT, de “tucanófila”. Fosse mesmo, talvez não tivesse fechado. O e-mail de Paulo Moura é simpático, mais até do que o de alguns de seus fãs. Ele é professor? Então sabe que as palavras têm sentido. Quando mete lá o adjetivo “tucanófilo” em mim, qualquer reprodução do que penso sai alterada por esse filtro. É impossível que não saiba disso. Leandro Vilas, por exemplo, não gostou do que escrevi e aponta até um “recalque trotskista” na minha reação. E é peremptório: “estrilou, sim”. Embora seja discutível que se possa falar em “recalque” só porque fui trotskista, prefiro isso a tucanófilo. Recomenda-me que leia outras análises de Moura. No que me diz respeito — e reagi ao que me diz respeito —, não muda nada.

Pois bem: pensando o que penso, sou tucanófilo; Moura, pensando o que pensa, é o quê? O meu ponto de vista estaria comprometido pelas minhas simpatias; o dele não? Como é que o professor Paulo Moura vai fazer para tirar do seu texto a evidência de que uma das razões por que ele diz que estou errado deriva de minhas afinidades eletivas? Há ainda quem tenha me criticado porque vivo chamando este ou aquele de “petralha”, o que me impediria de reagir, entende-se, à qualificação de tucanófilo. Errado. Chamo, sim, quando acho que é o caso. Daqui a pouco, vou comprar uma nova briga, vocês vão ver. Mas nunca disse que a pessoa não pode reagir. Cada um faça o que achar melhor.

Olhem aqui. A minha independência me é muito cara. Sou trabalhador, posso escrever caminhões de texto por dia e, se minha pena estivesse aí para quem desse mais, certamente teria feito até escolhas econômicas mais sensatas. Sem assinar, posso lhes garantir que consigo defender Lula muito melhor do que alguns sabujos que vivem lhe lambendo as botas. Mas prefiro fazer como faço. E, se for o caso, quebro o pau também com meus potenciais aliados. Foi assim quando escrevi 40 textos (não um, dois ou dez, mas 40) defendendo a candidatura de Serra à Presidência. E enfrentei patrulha de todo lado, a começar dos entusiastas da candidatura de Alckmin, que acharam que seria mel na sopa fazer dois trabalhos que consideraram simples e corriqueiro: 1) tornar Alckmin conhecido; 2) mudar a opção de uma larga fatia do eleitorado. Leandro me diz que Paulo Moura não é nenhum Chalita. Ainda bem. Um já basta. Penso o que penso sozinho, eu com os meus gibis do Tio Patinhas.

PS: Em seu e-mail, Paulo Moura deixa claro que não tentou ser doloso e que vai continuar a ler os meus escritos. Poderia ter continuado a ser sutil, mas não resistiu. Eu entendo. Fazendo referência aos tumores que extraí da cabeça, escreve: “Cuide-se, pois dizem que uma das causas do câncer e outras doenças da alma, é a raiva e a agressividade, dentre outras emoções negativas da mesma natureza.” Bem, Paulo. Não tive câncer. Os tumores eram benignos. Fossem malignos, não seriam uma “doença da alma”. Renego as teses que culpam o doente por sua doença. Isso, pra mim, é coisa da Igreja Universal do Reino de Deus. Costumo dar pouca bola a sujeitos indeterminados — “dizem”. Respondo a pessoas, quando têm nome e sobrenome, como você. Não entendi por que você insiste em falar da minha doença. Será que também ela compromete o meu pensamento, a exemplo da minha "tucanofilia"?

PS2 - De resto, Moura, hoje, consta, tem Ibope na Rede Globo. Estou torcendo, acredite, para que você esteja certo sobre o programa de Alckmin, e eu, errado. Leandro pode não acreditar, mas, às vezes, prefiro errar. É raro, mas acontece.

...Gosto do Paulo Moura. Só não engoli sua cruzada pró Alckmin. Respeito o seu Direito a ter suas opiniões, e a fazer suas opções.

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