13 de set. de 2006

PIB fermentado: previsão de crescimento de 4,75% para 2007 é ilusória

As expectativas do governo em relação ao crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro parecem ir na contra-mão do que diz o mercado financeiro. Esta semana, analistas consultados pelo Banco Central (BC) confirmaram as previsões do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) de um possível crescimento na faixa dos 3,3% para este ano. Enquanto isso, a proposta executiva de orçamento para 2007 prevê um incremento de 4,5% na economia do país em 2006 e de 4,75% para o ano que vem. Para especialistas em contas públicas, a previsão do governo é irreal e pode frustar as receitas previstas para 2007, compromotendo o equilíbrio orçamentário.

O Projeto de Lei Orçamentária (PLO) encaminhado pelo governo ao Congresso prevê uma fórmula digna de encher os olhos de qualquer eleitor. De um lado, um crescimento nominal de 10,2% dos gastos correntes da União em relação a este ano e a contratação de 46,6 mil servidores. Do outro, o aumento das receitas aliado à promessa de manutenção dos impostos, sem os aumentos que incomodam o bolso do contribuinte.

A fórmula mágica, no entanto, foi obtida a partir de um índice que, segundo especialistas, beira o conto de fadas. Para aumentar a arrecadação sem elevar a alíquota dos impostos, seria necessário um crescimento elevado da economia, o que vai na contra-mão das atuais perspectivas de mercado. As contas do governo estão baseadas em uma evolução de 4,5% para este ano e consequentes 4,75% em 2007. A previsão govenamental para o próximo ano supera em 1,2 pontos percentuais a perspectiva de expansão dos analistas consultados pelo BC, que não ultrapassa os 3,5%.

De acordo com levantamento feito pela Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara, caso não se confirme a previsão de crescimento do Executivo, o governo será obrigado a reduzir as despesas do próximo ano para equilibrar o orçamento. Considerando a dificuldade para reduzir as despesas obrigatórias (pessoal, previdência, saúde, juros, etc), poderá sobrar, mais uma vez, para os investimentos. Os técnicos apontam para uma redução de cerca de R$ 5,2 bilhões das receitas da União, caso o crescimento do PIB fique no patamar esperado pelos analistas.

Além de estar muito acima da previsão do mercado financeiro, as estimativas do PLO para o PIB deste e do próximo ano estão bem acima da média de crescimento do país nos últimos 20 anos. Segundo dados do IBGE, de 1986 a 2005, a economia brasileira apresentou uma evolução média anual de 2,4%. A base de cálculo usada pelo governo para o orçamento 2007 também ultrapassa em 2,1 pontos percentuais a média de crescimento das riquezas geradas pelo país durante os três primeiros anos da gestão Lula. Se a expectativa do governo, considerada ilusória por alguns especialistas, virar realidade, o desempenho da economia do próximo ano será o quinto melhor desde 1986.

O pessimismo do mercado para os próximos 15 meses reflete o péssimo desempenho da economia no segundo trimestre de 2006. Segundo dados do IBGE, o PIB cresceu apenas 0,5% em relação aos três primeiros meses de 2006 e 1,2% frente o mesmo período de 2005. Para o analista Alexandre Bassoli, economista do banco HSBC, diante dos resultados do último trimestre a previsão do governo para o cálculo das despesas e receitas do próximo ano estrapola todas as expectativas do meio econômico. “A previsão está otimista demais”, reforça.

Segundo o economista, a estimativa pouco prudente de crescimento do produto e das receitas impõe riscos de deterioração adicional da qualidade do ajuste fiscal. O especialista em contas públicas, Raul Velloso, também admite o risco da arrecadação prevista pelo governo para 2007 não atingir o patamar esperado, caso a evolução do PIB não chegue aos 4,75%.

No entanto, segundo o economista, existem mecanismos compensatórios para solucionar as perdas de receita, como uma arrecadação extraordinária ou o corte de gastos. “A Receita Federal vem se esforçando na adoção de fórmulas não convencionais que resultem em uma arrecadação extraordinária, como é o caso de estímulos para credores acelerarem o pagamento de dívidas com a União. Esse é um fator que não podemos prever. Caso o governo não consiga essa compensação, a solução será reduzir os gastos”, explica.

Assim como Bassoli, Velloso considera a previsão do governo ilusória frente o comportamento da economia mundial. No entanto, acha natural essa visão otimista, vinda do Executivo. “Não acredito que seja um sintoma eleitoral. Todo governo sempre vende um pouco mais de otimismo em relação ao crescimento da economia. Seria problemático se o valor dobrasse”, conclui.

O especialista em finanças e autor do livro “Gestão Pública”, Edson Ronaldo Nascimento, acredita que o crescimento do PIB brasileiro para 2007 deverá acompanhar o crescimento da média mundial, algo em torno de 3%. No entanto, o especialista admite que não se surpreenderia com uma evolução de 4% em 2007, visto que a situação fiscal está sob controle o que deve atrair e possibilitar a realização de novos investimentos no país.

Segundo Nascimento, o aumento ou a redução de um ponto percentual na taxa de crescimento real do PIB gera um impacto da ordem de R$ 2,4 bilhões sobre a receita do país. “No entanto, o próprio orçamento público federal possui mecanismos que corrigem tanto as frustrações na arrecadação como o aumento da receita. O importante é que ao final as metas fiscais sejam cumpridas, e isso tem sido realizado” acrescenta.

Na última semana, o secretário executivo do Ministério da Fazenda, Bernard Appy admitiu que o governo vai reavaliar a projeção de crescimento para este ano. Segundo ele, isso será necessário para a reavaliação de despesas e receitas federais que o Executivo tem que mandar para o Congresso. O secretário executivo garantiu, no entanto, que o crescimento de 4% ainda é possível, já que a tendência do desempenho da economia a partir do terceiro trimestre é de evolução.

Mariana Braga
Do Contas Abertas

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