15 de ago. de 2006

Risco País - by Rodrigo Constantino

Sobreviver nos mercados financeiros às vezes significa bater em rápida retirada.” (George Soros)

Curiosamente, os petistas passaram a demonstrar bastante interesse no tal “risco país”, antes considerado como instrumento de “especuladores gananciosos” para prejudicar os interesses nacionais. Claro, o risco país está em níveis historicamente baixos, e os petistas, sempre com seus dois pesos e duas medidas, tentam usá-lo como “prova” das benfeitorias de Lula. Mas isso faz algum sentido? Me pergunto se os petistas têm alguma idéia do que vem a ser o risco país...

O JP Morgan criou o EMBI, um índice que calcula o retorno dos bonds de diversos países emergentes. A taxa é medida em spread sobre os títulos do governo americano. Essa taxa pode ser considerada como uma aproximação da percepção de risco dos investidores estrangeiros em relação aos países emergentes. Mas na verdade, diz respeito somente aos títulos do governo, onde o retorno depende basicamente da capacidade deste de pagamento do seu endividamento externo. Se a dívida externa de um governo é pequena, provavelmente ele pagará taxas civilizadas aos detentores de seus bonds. Logo, o fato do risco país de determinada nação ser maior que o de outra, não quer dizer, necessariamente, que o país em si está em melhor situação. O risco país do Brasil já superou o da Nigéria, e ninguém seria louco de afirmar que somos um país pior que a Nigéria, por mais que os próprios petistas, no governo, esforcem-se para tanto.

No começo de 2002, nosso risco país bateu os 700 pontos base acima dos títulos americanos. Estava em declínio após várias crises que tanto afetaram os mercados emergentes, como a da Ásia em 1997, a da Rússia em 1998 e o estouro da bolha de tecnologia em 2000. Porém, foi ficando claro que o então candidato Lula seria o próximo presidente do Brasil, e levando-se em conta todo seu histórico de pregações radicais – incluindo o calote da dívida externa – o risco país explodiu. No final de setembro, chegou a encostar nos 2.500 pontos base acima dos títulos americanos. Vários investidores, não sem razão, temiam um governo Lula. Não era apenas a Regina Duarte que tinha medo. Qualquer um que conhecesse o currículo de idéias defendidas por Lula, suas amizades e participação no Foro de SP tinha motivos de sobra para desconfiar. Na dúvida, a preservação de capital fala mais alto, e ocorre um “flight to quality”, quando os investidores buscam um porto seguro para seus investimentos, mesmo que sacrificando retorno imediato. Assim, o risco país dispara e não é suficiente para estancar a sangria de capital.

Desde então, o risco país do Brasil vem sistematicamente caindo. Atualmente, perto dos 200 pontos base, está na sua baixa histórica. Seria mérito do Lula? Quem tenta atribuir isso ao presidente do “mensalão” ou age de má-fé ou ignora os fatos. Na verdade, o risco país de todos os países emergentes vem caindo drasticamente desde então. O mundo encontra-se num cenário altamente favorável aos emergentes, com preços de commodities em alta, o fator China impulsionando as economias, a inflação contida pelas pressões deflacionárias do capitalismo global e um excesso de liquidez nos mercados. Assim, o risco país médio dos países emergentes, excluindo a Argentina em default, saiu de 900 pontos base em 2002 para baixo de 180 pontos hoje. A tendência de queda é mundial, e o Brasil ainda tem um risco país acima da média dos demais emergentes. Se a queda no Brasil foi mais acentuada, isto deve-se ao fato de que tiraram o “bode” da sala, que era o próprio Lula histórico.

Justiça seja feita, algum mérito o governo Lula teve. Foi o de não seguir aquilo que era pregado pelo PT no passado! Manter a política macroeconômica do governo anterior foi uma das poucas medidas acertadas neste governo. O Banco Central, com equipe predominantemente formada durante a gestão de FHC, e gozando de razoável autonomia, foi capaz de aproveitar o vento benigno de fora para reduzir nossa dívida externa e aumentar as reservas cambiais. Como o risco país, medido pelo EMBI, trata apenas dessa capacidade de pagamento do endividamento externo, é claro que tinha que despencar. Não foi um fato isolado do Brasil. O endividamento externo dos emergentes, como um todo, desabou, o que explica justamente a queda generalizada do risco país. Se fosse mérito de Lula, o homem deveria tentar o cargo de Deus, não de presidente do Brasil.

Em recente relatório, o Morgan Stanley reconhece essa drástica redução do risco externo dos países emergentes, concluindo que a atenção dos investidores deverá voltar-se para os fatores internos, tais como carga tributária, burocracia e flexibilidade trabalhista. Nestes quesitos, o Brasil perde feio da concorrência. Os países do Leste Europeu têm feito o dever de casa. Alguns adotaram impostos flat, com taxa única para todos, e reduziram a burocracia. No Brasil, a carga tributária, perto de 40% do PIB, é uma das maiores do mundo. A burocracia é asfixiante. As “conquistas” trabalhistas dobram os custos de contratação, jogando milhões para a informalidade. A dívida pública chega a um trilhão de reais!

Em resumo, quando saímos da fantasia do risco país, que mede apenas a capacidade de arcar com os títulos externos, para colocar uma lupa na situação interna, não resta muito o que comemorar. E Lula não fez uma reforma estrutural sequer que melhorasse a perspectiva futura do país. Mas quem liga para isso? Os petistas agora comemoram: o risco país bateu 208 pontos, seja lá o que isso quer dizer. Mais quatro anos de “mensalão”, de autoritarismo estatal, de falta de reformas básicas, de populismo irresponsável, de crescimento dos gastos públicos...

Com autorização do Rodrigo Constantino

Nenhum comentário: