9 de ago. de 2006

O Petróleo e a Inflação - por Rodrigo Constantino

Com o preço do barril de petróleo chegando perto de US$ 80, as lembranças dos tempos de estagflação vividos durante os choques na década de 70 voltam a assombrar os investidores. A crença é de que a alta no preço do “ouro negro”, importante insumo para toda a cadeia produtiva, gera um efeito dominó, pressionando todos os outros preços, além de reduzir a atividade econômica. A combinação explosiva teria como resultado, portanto, o pior dos mundos, com inflação acelerando e crescimento desabando. A própria ata do Fed incita tal medo, ao afirmar que “elevados níveis de utilização de recursos e dos preços de energia e outras commodities têm o potencial de sustentar pressões inflacionárias”. Mas será que faz mesmo sentido econômico isso?

O petróleo é, de fato, mais uma commodity, como o níquel, cobre, alumínio ou aço. E com certeza ele é utilizado como matéria-prima básica para diversos setores industriais, além do consumo final para transporte e energia. Mas por que um aumento no seu preço, causado, por exemplo, por um choque de oferta, iria gerar inflação? Vamos supor que um oleoduto gigante se rompa, causando uma interrupção importante no fornecimento de petróleo. Qual seria o efeito disso? Ora, ceteris paribus, a alta no preço do petróleo teria que ser compensada pela queda em algum outro preço, causada pela redução na demanda, fruto da substituição na alocação de recursos, ou então levaria a uma redução na demanda pelo petróleo mesmo, forçando novamente os preços para baixo. Com uma quantidade fixa de moeda na economia, a elevação dos preços de um produto é compensada pela queda dos preços de outros produtos ou pela queda na demanda do próprio produto. Ocorre uma mudança nos preços relativos, mas não uma alta generalizada de preços, i.e., inflação.

Para que isso fique mais claro, basta pensarmos em termos micro, no orçamento de um indivíduo. Caso a gasolina que ele consome suba de preço, ele terá basicamente duas opções: reduzir seu consumo de gasolina; ou deixar de consumir algum outro produto para manter o mesmo consumo de gasolina. Se a primeira opção é tomada, haverá uma queda da demanda por gasolina, pressionando novamente para baixo seu preço, após a alta causada pelo choque de oferta. Se a segunda opção é escolhida, algum outro produto terá queda na demanda, tendo os preços pressionados para baixo.

Portanto, a alta nos preços de algum produto específico, qualquer que seja, não é, por si só, inflacionária. A inflação é sempre um fenômeno monetário. O que está por trás então da percepção de que uma alta no preço do petróleo gera inflação? Na verdade, o esquecimento do termo ceteris paribus. O problema é que os governos dificilmente aceitam um ajuste necessário na demanda de um produto importante quando seu preço sobe por conta de um choque de oferta. A queda na atividade é bastante impopular. Tentando evitar uma ressaca natural, o governo oferece mais álcool para o bêbado. Ele monetiza a economia, injetando mais moeda no sistema, buscando assim evitar uma queda na atividade. Com mais moeda em circulação, há uma ilusão momentânea de aumento na demanda. Porém, trata-se apenas de uma ilusão mesmo. Com o tempo, o único resultado é um aumento generalizado no nível dos preços, sem a contrapartida na atividade econômica. Afinal, não ocorreu aumento algum de produtividade que levasse a um crescimento maior da produção. A demanda estava crescendo apenas na aparência, graças ao estímulo artificial do governo.

Espero ter deixado claro que o aumento isolado do preço de um produto qualquer, por mais relevante que ele seja para a economia, não é gerador de inflação. O que causa a inflação é a monetização exercida pelo governo, que aumenta a quantidade de moeda em circulação para evitar a queda da atividade. Além disso, devemos ter em mente que o petróleo já não tem mais a mesma importância que tinha no passado. As economias dos países desenvolvidos são bem mais concentradas em serviços atualmente. A participação do petróleo na economia global vem despencando nas últimas décadas. Eis mais um fator que deveria acalmar os mais desesperados com o aumento no preço do barril de petróleo.

Na verdade, o grande problema que vejo nesta escalada do preço do petróleo é de outra natureza. Grande parte da oferta de petróleo está concentrada em poucas ditaduras no Oriente Médio, ou em estatais sujeitas aos caprichos de políticos poderosos em outros países. Os principais produtores são Arábia Saudita, Irã, Rússia, Venezuela, Nigéria, enfim, países onde o livre mercado não funciona direito e o setor público domina a cena. Ora, sabemos que a alocação de recursos será sempre mais eficiente se realizada pelo setor privado, que busca as melhores alternativas disponíveis de investimento. O mesmo não acontece no setor público, ainda mais quando temos ditaduras ou quase-ditaduras. A fortuna arrecadada pela venda do “ouro negro” vai parar em palácios luxuosos, financiamento de grupos terroristas islâmicos, compra de caças e fuzis russos para oprimir o próprio povo etc. Ou seja, a alta no petróleo acaba funcionando como um imposto, transferindo riqueza do setor privado para o setor público. E este costuma sempre gastar mal o dinheiro arrecadado, sem levar em conta custos de oportunidade ou retornos esperados. Assim, a alta do petróleo tem transferido bilhões de dólares para figuras pitorescas como Chávez ou Ahmadinejad. Não dá para esperar nada de bom vindo dessa turma...

Com autorização do Rodrigo Constantino

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