28 de jul. de 2006

SEM RESPONSABILIDADE - por Ralph J. Hofmann

Salta aos olhos a diferença entre governar um país ou simplesmente manter uma força armada dentro de um país.
Vemos mulheres histéricas chegando do Líbano aos aeroportos brasileiros chorando as mágoas de ter deixado para trás parentes e amigos sem comida, sem água, sem abrigos antiaéreos.
Do outro lado vemos Haifa evacuada na medida do possível, prédios com abrigos, uma sociedade funcionando sob fogo inimigo, exatamente como já faz de uma forma ou outra ha 58 anos.
Em 1937 o escritor Nevil Shute escreveu o romance “What Happened to the Corbetts” em que descrevia o que imaginava que ocorreria no caso de um bombardeio de cidades inglesas como de fato veio a acontecer três anos depois. Shute era engenheiro aeronáutico. Conhecia as possibilidades dos aviões e bombas da época. Sabia detalhes sobre o que ocorrera em Guernica e outras cidades espanholas e alguns do bombardeios japoneses nas lutas na China, que já se arrastavam ha uma década. Em seu livro discutia prédios em chamas, epidemias causadas por cadáveres insepultos e consumo de água não-tratada, o colapso de prédios com pessoas dentro e todos os horrores que poderiam ocorrer. Descreveu tentativas frustradas de evacuar crianças para o campo após o início dos bombardeios.
Lançado o livro, Nevil Shute e o editor enviaram 1.000 cópias do mesmo para as autoridades que por lógica seriam responsáveis pela defesa civil da Inglaterra em caso de guerra. O livro sendo um romance por um escritor empolgante, as pessoas que o receberam leram sofregamente e passaram adiante, mas também sentiram a mensagem que o mesmo trazia, e passaram a criar programas para o caso de guerra. .
Iniciada a “blitz” sobre as cidades inglesas a defesa civil estava pronta e treinada para enfrentar tudo. Algumas das previsões tais como as epidemias e a falta de acesso à água potável, não vieram a ocorrer, havia equipamentos para salvamento de pessoas sob escombros, bombas de água leves para combate a incêndios. Não é sabido até que ponto o livro afetou a criação dessas precauções, mas mostrou que a guerra moderna não é apenas um problema militar. É uma ação de governo também.
O que dizer da guerra no Líbano hoje. O país tem um governo totalmente desvinculado das ações militares. Como tal não tem realmente esquemas de evacuação ou de transporte de suprimento sob fogo. Não pode sequer negociar colunas de evacuados com o governo de Israel. O Hezbolah por outro lado, não sendo governo não tem responsabilidade para com os civis. Também não criou abrigos e estoques de alimentos para os civis. Hospitais idem. É unicamente uma organização militar.
A todas essas, o Vale do Bekaa, donde foi retirado o maior número de refugiados brasileiros é feudo do Hezbolah há mais de 20 anos. Mas apenas para fins militares. Quem administra as cidades são os prefeitos. Não há uma organização nacional que pudesse prever evacuações , hospitais, sistemas de combate ao incêndio. E isso num país que quando não está em guerra com os vizinhos está em convulsão interna há mais de 30 anos.
Em tempo, já que a Revolução Bolivariana está se armando copiosamente, caso alguém saiba localizar uma edição de “What Happened to the Corbetts” em espanhol, sugiro fotocopiá-la e enviar para o Evo Morales e o Hugo Chavez. Sei que o livro não existe em português, mas pagando bem terei prazer em traduzi-lo para o Lula e o Alckmin, pois no caso de uma Guerra Bolivariana dificilmente ficaremos de fora.

Com autorização do Ralph J. Hoffmann - fonte: Argumento & Prosa

Nenhum comentário: