30 de jul. de 2008

O massacre dos usos e costumes


O evento da exigência de venda de bananas por quilo em São Paulo, quando o costume popular é venda por dúzia, é típico. A violação desta lei torna o quitandeiro da esquina alvo de polpudas multas escudadas em mais uma miopia funcional de quem faz as leis ou mesmo legisla aboletado atrás de uma mesa de burocrata, numa sala com ar condicionado, através de portarias e resoluções não raro draconianas. Quando me mudei para Santa Catarina achei uma anomalia comprar laranjas a quilo. Lembrava-me de minha mãe me mandar à quitanda comprar duas dúzias de laranjas ou tangerinas no interior do Rio Grande do Sul. A verdade é que os quitandeiros é que sabem das coisas. Estão no negócio de atender ao seu mercado. Se os fregueses querem dúzias vendem dúzias. Se os clientes querem quilos vendem quilos. “O comércio e a indústria são um processo de satisfazer clientes”. O processo de montar imensas burocracias para fiscalizar a ferro e fogo normas decididas em escritórios com ar condicionado, conforme as opiniões de amanuenses que nunca venderam sequer uma rifa, quanto mais administraram um empreendimento que pode até ser tão humilde quanto uma carrocinha de pipoca ou a venda de balões em feira. Na Inglaterra, que sempre teve suas peculiaridades, começando pelos seus pesos e medidas diferenciados passando pelos nomes de certos quitutes e objetos todas as semanas há gritas contra as padronizações implantadas ferreamente pela Comunidade Européia atropelando os usos locais em nome de uma padronização. Por volta de 1974 vi em algum lugar que a British Standards Organization (Organização Britânica de Normas e Padrões) havia, após anos de discussões, determinado qual era o padrão para servir chá em estabelecimentos comerciais. Segundo a norma o chá (folhas secas) seria colocado na chaleira na proporção de uma colher de certo tamanho por xícara de água fervendo a ser agregada e mais uma colher adicional de chá para garantir. O chá deveria ser vertido nas xícaras na frente dos clientes. O normal seria agregar algumas gotas de leite que deveria ser frio, e que deveria ser adicionado após o chá ser colocado na xícara, e não antes disto. Contudo o cliente poderia mudar tudo isto. Poderia exigir o leite quente, poderia pedir limão em lugar de leite. A norma cobria a situação normal, como diz o nome. Mas o cliente mandava no que consumia. Então creio que o assunto das bananas é um sinal dos tempos. A frieza dos burocratas desvairados passa a operar como se fosse uma fúria insana dirigida às tradições populares. Um pequeno passo rumo a um mundo sem diferenças, absolutamente chato. Quanto tempo até que os burocratas normatizem os passos do frevo, do maracatu e da chula, do boi de mamão e do bumba-meu-boi? Porque as escolas de samba já são manifestações completamente formalizadas. Os burocratas das escolas de samba já destruíram a espontaneidade.

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